domingo, 19 de dezembro de 2010

CAPÍTULO III

LIÇÕES DE VIDA DE UMA MÃE ESPIRITUAL - FLÁVIA
Tenho 18 anos. Cheguei aqui em janeiro de 2009. Vim pra cá quebrada na alma, nos sentimentos, tentando juntar os pedaços e em pouco tempo entendi que seria pesado demais conseguir fazer isso sozinha. No ano anterior foi a tempestade e aqui veio a bonança. Terminei o ensino médio aos 16 anos e ao completar 17 logo no início de 2008, ganhei um presentão da minha mãezona que me criou sozinha e foi sempre um referencial pra mim. O presente foi ir pra Austrália, berço do surf, pra competir no circuito internacional. Gente de todos os cantos do mundo participou.
Voltando do campeonato eu estava profundamente deprimida. Pela derrota? Não, não foi uma derrota esportiva, foi uma das lições que a vida dá, uma derrota da vida. Quando voltei, ainda em forte depressão, pude ouvir a conversa de Peter, primo de minha mãe que apesar de ser um pouco mais novo do que ela e um pouco mais velho do que eu, é como uma figura de pai pra mim:
- Como está a Flávia?
- Como ela pode estar? Péssima.
- Tá no quarto, né?
- Tá.
- Chame aqui, por favor.
- Não precisa chamar, já tô aqui. – eu respondi e me joguei nos braços de Peter.
- Tava morrendo de saudade, Peter, que bom que você tá aqui.
- Minha princesinha do surf. – ele me chamava sempre assim
- Meu rei dos mares.
- O rei dos mares tá aqui pra dar uma boa notícia.
- O que? – perguntei sem entusiasmo
- Você pode retomar seus treinos depois deste tempo que ficou de molho, ou melhor dizendo: “a seco” numa academia em Floripa.
- Mas ela já é praticamente profissional! – minha mãe se indignou – Depois de um torneio na Austrália você quer que ela vá pra Floripa?!
- Prima! Que é isso?! Parece antinacionalista! Nós somos descendentes de europeus, mas somos nascidos e criados no Brasil! Ai de quem diga que eu não sou brasileiro! É como diz na música: “Eu sou brasileiro, meu todo revela que a minha bandeira é verde amarela”!
- Peter... Eu não sei se quero ir. – eu disse
- Por que não?
- Ah...vai me lembrar tudo... – comecei a chorar e Peter me abraçou
- O que cura uma dor é procurar pelo que você gosta no lugar onde sejam curadas as feridas. É como tá na Bíblia: Mas ele foi ferido por causa das nossas transgressões, e moído por causa das nossas iniqüidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados. (Isaías 53 : 5). Eu senti o que é isso e você vai sentir.
Apesar da minha relutância, Peter tava tão determinado que aquela injeção de ânimo contaminou minha mãe e logo a seguir a mim. Eu fui. Cheguei retraída, mas ouvi com atenção as recomendações do Allan.
- Todos vocês aqui estão em busca de um ideal. Ninguém vence ninguém, todos competem. A vida é eterna luta. A competição que se vê por aí é um tentando derrubar o outro, mas não é esta a nossa visão. Há quase 20 anos treino candidatos aqui e não houve vez alguma que não saíssem daqui grandes amigos. Por incrível que pareça, mesmo na perda um abraçava o outro e abençoava o seu sucesso. Os aparentes perdedores sempre tiveram metas. Os que não puderam ir disputar no circuito internacional, muitos deles se tornaram excelentes treinadores, alguns me assessoraram e estão aqui até hoje, outros foram com alunos daqui pra outras partes do mundo pra treiná-los lá. Não há perdedores aqui, todos adquirem experiência. Tudo o que se aprende aqui é importante. Não há lugar para exibições em nenhum sentido. Não admito rivalidade e aos que estão ainda com 17 anos, lembrem-se que são menores e somos responsáveis por vocês. Os de 18 são maiores, mas têm que cumprir com horários e obrigações. Aqui todos lavam suas roupas, arrumam seus quartos e lavam seus pratos.
Depois de mais algumas explicações, Allan apresentou a Carla que ia dar umas aulas de aeróbica e mandou a gente ficar à vontade e ir surfar de uma maneira bem descontraída. Eu tava ainda chateada e fiquei afastada do grupo. Quando voltei da água, reparei que Carla me observava ao lado de Alessandra.
- Flávia, a gente tava te observando, você surfa muito bem. – Alessandra elogiou.
- ‘Brigada... – agradeci de cabeça meio baixa e Carla, sorridente, levantou meu queixo com a mão e me olhou com uma ternura que dava até pra ver os olhos brilhando por detrás daqueles óculos escuros.
- Cabeça erguida minha linda.
- Ela é minha amiga desde que me entendo por gente. – Alessandra abraçou Carla. Senti que havia uma amizade muito forte entre as duas.
- Nós somos xipófagas de coração! – Carla enfatizou.
- É... – Alessandra riu
- Gente, eu tenho que entrar. Vou deixar vocês se conhecerem mais, o tempo da Carla aqui vai ser curto.
Alessandra nos deixou a sós e Carla permanecia olhando pra mim com ternura.
- Se eu tivesse tido uma filha queria que fosse tão linda quanto você.
- Você não tem filhos?
- Tenho um. Um gatão. Tem 15 anos e veio comigo. Ele tava tão cansado que ficou vendo TV lá dentro e dormiu no sofá.
- Sei...
- Você parece triste.
Logo que ela falou isso, não agüentei e chorei. Deus havia mandado um anjo pra me consolar, naquele momento difícil e desabafar como faria com minha mãe. Ela me abraçou.
- Chora. Também tive quem me oferecesse os braços em momentos difíceis e te ofereço os meus. Se não quiser falar agora, não fala, só chora, esvazia tudo.
Chorei mais e mais de soluçar alto. Não senti vergonha. Senti liberdade pra chorar naqueles braços fortes que me acolhiam. Nunca fiquei tão à vontade com uma pessoa que acabava de conhecer, mas ela era especial. Depois que respirei fundo, ela me deu uma água de côco. Sentamos e conversamos.
- E aí, quer falar?
- Eu...tô até gostando de estar aqui, mas tô vindo pra esquecer e não consigo.
- Você tá aqui pra se curar.
- Como assim?
- Só Deus sabe o que tá sentindo. Ele sabe de tudo, mas eu só vou saber se você falar.
- Você teve alguma desilusão quando era da minha idade?
- Você tá com quantos anos?
- Fiz 18 há pouco tempo.
- Sei... Exatamente na sua idade m apaixonei na hora errada, mas depois passei a amar na hora certa.
- Cumé que é?! - Perguntei achando graça. Aquele comentário estranho me descontraiu.
- É louco, mas foi o que aconteceu comigo. Eu conheci um homem mais velho, ele era casado. Eu não queria ter nada com ele, mas a persistência dele foi tanta que não agüentei. Cedi. Fomos infelizes, ele teve que se afastar. A mulher dele tava doente. Eu tava grávida e ele nem soube logo. Em pouco tempo fiquei sem ele, perdi o neném e meu pai morreu.
- Pôxa... O que você falou antes pareceu até engraçado, mas agora eu fiquei triste.
- Foi triste, mas eu aprendi o quanto Deus pode perdoar e deixar a gente recomeçar depois que reconhece o erro.
- Eu... também perdi um filho.
- Não foi por acaso que eu quis falar com você. Quando a vi surfando isolada, senti que tava perdida no meio do grupo. Quer contar como foi?
- Eu fui competir na Austrália ano passado. Conheci um garoto japonês, Takaki.
- Atração à primeira vista?
- É...
- Aconteceu lá?
- Depois do campeonato na Austrália a gente comemorou até demais. Voltei pro Brasil e participei de um campeonato Saquarema. Ele também participou.
- E aí?
- Ficamos juntos de novo, mas ele não queria nada de sério. Ia a festas, enchia a cara e pegava várias garotas.
- Em resumo, o cara queria só bagunça, né?
- É... – chorei novamente – Eu fui surfar no exato momento em que o vi de agarramento com uma garota numa festa que tava rolando na praia. Queria descontar minha raiva no mar. Eu bem senti que minha regra tava atrasada, mas não tinha certeza de nada. Levei um pancadão no mar, pois tava desconcentrada. Tive uma hemorragia e se não tivesse salvamento por perto, eu teria morrido afogada. Matei meu filho sem querer...- chorei mais ainda e ela me abraçou
- Minha linda, desilusões amorosas todos nós estamos sujeitos a sofrer. Se eu tivesse 18 anos hoje, com a cabeça que tenho, esperaria o momento certo de me entregar depois do casamento. Você parece uma pessoa muito sensível, isso te machucou muito. Mas tem alguém que cura as feridas e cujo nome é acima de todo nome: Jesus. Foi Ele que te trouxe aqui e foi ele que me uniu novamente ao pai deste filho que perdi. Eu o reencontrei depois que ele enviuvou e ele me apresentou a Este Deus maravilhoso que sara cura e liberta. Nossas vidas foram restauradas, nós nos casamos e ele me deu o filho que temos. Tá vendo este mar revolto? E aí que Deus joga tudo o que fizemos de errado depois que nos entregamos a Ele. Responda sem pensar: quer aceitar Jesus como seu único e suficiente salvador?
- Eu...
- Tá pensando muito. Você não pensou pra errar, agora não pense pra acertar.
- Você diz umas coisas assim tão... Tão...
- Loucas, né? É isso mesmo. Mas Deus escolheu as coisas loucas deste mundo para confundir as sábias; e Deus escolheu as coisas fracas deste mundo para confundir as fortes; (I Coríntios 1 : 27) desde que me casei foi esta a palavra que mais assimilei por que resume tudo o que vivi. Depois vou mostrar a você minha história que tá no blog VIDAS SEPARADAS e você vai ver o título que dei ao capítulo do dia do meu casamento: UM DIA LOUCAMENTE ESPECIAL. As coisas de Deus são tão maravilhosamente loucas que eu sou cada vez mais louca por Ele. Quer enlouquecer por Deus e saber como Ele transformará loucamente sua vida, numa loucura de amor ágape, de renovação, de esperança? Foi através da transformação da vida do Marcos, meu marido que entendi isto. Ele era tão safado quanto este garoto que você falou, mas Deus o transformou e pode até transformar esse garoto. Não digo que você vá ficar com ele um dia, pois cada caso é um caso e o meu foi uma experiência que Deus queria que eu passasse. A sua é só sua.
- Eu quero este Deus.
- Repita comigo: Senhor Deus, creio que tu és o criador dos céus e da terra e que deste seu amado e único Filho Jesus para que eu tivesse a vida eterna e eu O aceito como meu único e suficiente salvador. Perdoa os meus pecados e escreve o meu nome no livro da vida. Eu te agradeço em nome de Jesus, amém.
Repeti até o fim e a partir dali tive uma vida nova e nunca me esqueci da Carla que passei a amar como uma mãe.

4 comentários:

  1. Gostei tanto desse capítulo, e apreciei a maneira como a Carla passou a experiência dela para a Flávia.Às vezes passamos por situações adversas, mas tudo serve como experiência que pode nos fazer crescer e ajudar a outras pessoas.

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  2. Gostei muito desse capitulo principalmente o que Carla falou: Não pensamos pra fazer coisas erradas, mas pra fazer coisas certas temos que pensar muito.
    Certas decisões precisam ser tomadas urgentes.

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  3. Ai que lindo este cap!!! Gostei muito.. MESMO!!
    O testemunho da Carla é muito forte.. e eu tenho certeza de que muitas vidas seriam impactadas por um testemunho desses .. bem como foi para a Flávia!!

    Parabéns, Vinicius!!

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  4. Estou encantada!! que lindo testemunho da Carla!! passando pro próximo!!
    Passando pro próximo...

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