domingo, 29 de novembro de 2009

CAPÍTULO XXXV

SE AQUEÇAM COM O MEU CORAÇÃO – BRENDA
Ai...41 anos. Como o tempo passou rápido. Dia 14 de setembro de 2009. O dia tá meio nublado e eu aqui terminando de escrever neste blog. Carla, eu e Alessandra, VIDAS SEPARADAS pelas circunstâncias, mas nunca separadas da amizade e muito mais separadas para o SENHOR. Vencemos as lutas. Alguém pode achar que eu não tenha tido tantas, mas as lutas de Alessandra e Carla sempre foram minhas lutas. Depois de alguns anos como coordenadora numa escola, abri a minha, CORAÇÃO DE DEUS em Madureira onde atualmente moro e estou no computador do meu escritório escrevendo. Recebo meus “adocelentes” – falo assim, pois não vou amaldiçoar ninguém e chamar de aborrecentes, que horror! - no gabinete pra ouvir suas alegrias e tristezas. Algumas queixas: “Pô tia Brenda, meu pai ou minha mãe, não se ligam! Não me entendem!” Eu digo: “Meu querido, minha querida, Honra a teu pai e a tua mãe, que é o primeiro mandamento com promessa; (Efésios 6 : 2). Quando ficam ansiosos, lembro que tudo tem seu tempo, leia Eclesiastes.” Disciplino com muito amor e programo passeios pra aprenderem com a bela natureza que o Pai criou e nos deu pra cuidar e comparo o cuidado dela, com o meu com eles, que são minhas flores que rego.
Eu e Márcio, meu marido, somos pastores. Temos um casal de filhos: Daniel de 16 anos e Débora de 14.
Daqui a pouco vou almoçar com Alessandra e Carla.Alessandra divide-se entre Copa e Floripa onde ajuda Allan a treinar a galera na academia de surf e Carla mora no Centro. Tiramos um tempo pra nós. Comemoramos mais de uma vez nossos aniversários no ano passado, fizemos uma festa especial juntas. 40 anos, idade marcante. Dizem que a vida começa nesta fase, mas tô sempre recomeçando e minhas amigas também.
O Gabriel, filho da Carla tá um gatão de 16 anos e a Cristina, da Alessandra vai fazer em 15 dias, 15 primaveras.
Natalinha filha do Allan, casou no início deste ano. Ela já rodou o mundo participando de missões, trabalhou e morou na Itália e fez cursos na Irlanda do Norte.
Marion, filha mais velha do Marcos tem um filho de 13 anos, Tiago e uma filha de 10, Joana; Marcele filha do meio, casou-se há 8 anos e teve dois filhos: Vitor que tá com 6 anos e Isabel, com 4. Marquinho, o filho caçula é recém casado.
Como é lindo ver a família de Deus crescer!
Bem, vou terminar, talvez depois escreva mais algo. Fiquei de encontrá-las no Centro às 12:30. Uma chuva se anuncia, mas isso não atrapalha. Chuva de bençãos como tantas que recebemos e depois das tempestades vieram as bonanças.
Abraços, risos e lágrimas de emoção. São sempre assim nossos encontros. Minhas gataças de 41 anos, enxutas, lindas!
- Menina, já não podia mais de saudades! – Alessandra quase me sufocou me abraçando.
- Isso é que é morrer de saudade! Quase me mata também! – eu brinquei também apertando a loiraça enxuta
- Brenda, minha amiga, minha irmã, minha querida, minha fonte de luz, minha mãezinha que cuidou de mim quando eu tanto precisei! – Carla também se abraçou comigo
- “Amigas eu nunca vou desistir de vocês e pelas suas vidas vou interceder, mesmo que eu esteja longe, meu amor vai encontrar vocês por que vocês são impossíveis de esquecer”! – cantei pra elas
- Ai, querida! Brigada! Também amo esta música! – Carla agradeceu abraçando-me
- E eu também! – Alessandra disse - Amor da minha vida! – e me abraçou também.
- Ela é minha também! E você também! – Carla abraçou-me também, abraçando Alessandra
Abraçamo-nos todas as três. Pessoas que passavam achavam-nos três malucas. Três grandes loucas por Jesus e do amor ágape.
Mais um almoço, inesquecível.
- Ai, gente, quantas voltas a vida dá, né? – Alessandra comentou
- Gente, eu tava até a pouco tempo escrevendo meu blog, narrando tantas coisas das nossas vidas. – eu comentei
- Eu também. No dia em que nossas vidas foram separadas – Alessandra lembrou.
- Nossas vidas podem ter sido separadas, mas nunca nos desgrudamos. – eu acrescentei
- Somos gêmeas xipófagas de coração. – Carla brincou - Eu também registrei esses momentos no meu blog.
- Nossas vidas foram separadas pra Deus. – eu frisei
- Taí. VIDAS SEPARADAS, bom nome prum texto. – Alessandra opinou
- Como você sabe? – perguntei espantada
- Por quê? – Alessandra devolveu a pergunta
- Foi título que eu coloquei quando tava escrevendo do dia 08 de agosto até hoje.
- Eu também pensei num título assim sobre nós. – Carla falou
- Confirmação do Espírito Santo. – eu constatei
- Quantas coisas nós passamos. Encontros, desencontros e reencontros. – Alessandra lembrou dando um suspiro.
- É.. mas estamos sempre juntas. – Carla olhou pra nós com emoção derramando uma lágrima.
Unimos as mãos e cada uma beijou a da outra.

Leva o meu coração contigo,
Guarda o meu coração amigo
E nos dias de inverno e solidão se aqueça com o meu coração.


FIM

sábado, 28 de novembro de 2009

CAPÍTULO XXXIV

UM DIA LOUCAMENTE ESPECIAL – CARLA
10 de outubro de 1992. Um dia loucamente especial. Por quê? Ninguém poderia imaginar que aconteceria, “Mas Deus escolheu as coisas loucas deste mundo para confundir as sábias; e Deus escolheu as coisas fracas deste mundo para confundir as fortes” (I Coríntios 1 : 27) Eu e o Marcos nos casávamos naquele dia. Louco né? Mas a gente foi tão louco um dia, tão inconseqüente, tão egoísta, enfim, tão tudo o que desagradava a Deus, que Ele mudou tudo na gente: um dia nós estávamos loucos por Ele. Claro que não foi fácil, houve todo um processo de mais de um ano pra que os filhos do Marcos não me vissem mais como a outra do pai que veio tomar o lugar da mãe deles. Os três já estavam na igreja desde o tempo que a Helena era viva. Marion, a mais velha, já tava com 18 anos e teve algumas reservas tanto quanto a Marcele, que já tinha 15.
Uma das minhas estratégias de aproximação foi nos 15 anos da Marcele. Achei que não devia participar da festa, pois pensei que seria pra família, mas fui lá antes e deixei meu presente. Falei com ela, pedi que me perdoasse, que só ficaria com o pai deles se fosse realmente da vontade de Deus. Ela até se sensibilizou e perguntou se eu não queria ficar, mas eu agradeci e expliquei que fui lá só por que queria o perdão dela e que com o tempo poderia ser que seus irmãos também me aceitassem. Marquinho estava com 10 anos e sentia muita falta da mãe, foi muito traumatizante pra ele. Era natural que a Marion se sentisse como uma segunda mãe sendo a mais velha e poderia ver seu posto ameaçado, mas disse à ela o mesmo que disse à sua irmã. Entreguei tudo a Deus e esperei n’Ele.
Enfim, casamos, vencendo as dificuldades, orando, jejuando, conversando muito com o pastor.
No dia do meu casamento joguei o buquê. Quem pegou foi Marion, que casou dois anos depois.
Mas voltando ao meu casamento, foi um dia loucamente e especialmente feliz. Alessandra e Brenda tavam lá na maior emoção. Brenda tava grávida de três meses do primeiro filho, Daniel.
Em 12 de agosto de 1993, nasceu meu filho, Gabriel. Lindo! Com meus olhos, minha tonalidade de pele meio amorenada, mas com os cabelos castanhos escuros uma mistura dos meus cabelos negros com os cabelos claros do pai.
Marcos passou a produzir shows pra artistas evangélicos o que mais tarde originou uma empresa, um grupo que mantem até hoje uma rádio gospel, editora de livros e uma gravadora. Eu passei a ensaiar a galera adolescente da igreja pra coreografias de louvor e a Marcele também participou, formando novos grupos.
Alessandra teve também uma filhinha que nasceu no dia 29 de setembro de 1994: Cristina, lourinha de olhos azuis e linda como a mãe.
Nós tivemos nossas vidas separadas pelas circunstâncias, pela distância, mas só fisicamente, pois nossos corações foram juntos um com o da outra. Sei que eu dei trabalho às minhas amigas, mas elas nunca encararam assim. Sempre fui considerada uma parte delas assim como sempre as senti partes de mim. Chorei com elas, sorri com elas, me emocionei com elas, ri com elas. Sempre com elas.

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

CAPÍTULO XXXIII

AMOR EM FLORIPA E EM OUTRAS ROTAS – ALESSANDRA
Reencontrei Allan nova criatura. Passei a ser uma nova criatura também e com Allan, descobri o verdadeiro amor em Floripa. Conheci a academia do surf e me encantei. Passei a ser a treinadora dos grupos. Uma experiência fascinante, uma galera irada, mesmo sendo um grupo variado de cabeças pensando diferente em relação às normas da academia, mas tinham uma coisa em comum: não aprender só as tarefas, mas na prática o que era uma vida com Deus. Mesmo que chegassem rapazinhos ou garotas entre seus 17 e 18 anos que ainda não houvessem aceitado Jesus, só de ver o procedimento dos colegas, começavam a se encantar com aquele Deus e os treinos, o companheirismo, a amizade, as trocas de idéias sobre as resoluções de problemas, a disciplina que Allan exigia, a liderança sempre com muito amor a vivência da palavra de Deus e a confiança que ele passava ao grupo eram os ingredientes perfeitos para originar a fórmula infalível de conversão. Lá mesmo na igreja de Floripa deu-se a nossa união, no dia 28 de março de 1992. Eu nem poderia imaginar que 6 anos depois do desencontro que houve entre a gente nos casaríamos, mas Deus transforma tudo, como está escrito: “Assim que, se alguém está em Cristo, nova criatura é; as coisas velhas já passaram; eis que tudo se fez novo.” (II Coríntios 5 : 17)
Outra vez houve aquela tradicional brincadeira de jogar o buquê. Outra vez Carla pegou. Ela continuava pedindo direção a Deus e esta era uma forma de resposta. Claro que também através de muita oração e jejuns. Passamos 15 dias em lua de mel no Havaí. Interessante é que quem estava lá também em lua de mel, era Adriana , a mesma com quem desfiz relações por causa de Allan. Ela já havia vivido com um cara e não tinha dado certo. Depois se casou na igreja e com festa bancada pelos pais. Aproveitei pra falar de Jesus com ela. Senti que ela ouviu por educação. Não tivemos mais muito contato, só sei que se formou também em Educação Física, continua hoje com o mesmo marido e tem duas filhas.
Brenda já era professora. Dava aula para turma da 1ª série do seguimento naquela época ainda chamado de 1º grau. Continuava trabalhando na loja, pois o salário de professora não dava. Depois de quase 10 anos juntando dinheiro ela poderia montar seu próprio colégio. Márcio, seu marido a ajudou a montar e administrar o colégio. Já era diácono na igreja e criou um grupo de teatro que se expandiu, ganhando muitas vidas pra Jesus.
Eu e Allan passamos a participar de campeonatos patrocinados pela igreja em parceria com empresas de surf e fazíamos missões por onde íamos, ganhando vidas pra Jesus. Beto também participou de algumas missões que a gente foi com outros irmãos da igreja. “Então disse Jesus aos seus discípulos: Se alguém quiser vir após mim, renuncie-se a si mesmo, tome sobre si a sua cruz, e siga-me.” (Mateus 16 : 24)

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

CAPÍTULO XXXII

O DIA MAIS IMPORTANTE DA MINHA VIDA – BRENDA
Dia 14 de dezembro de 1991, o dia mais importante da minha vida. Carla na presença do SENHOR, com um sorriso que irradiava luz e felicidade. Alessandra, ao lado dela, tentava conter a emoção. Eu, trazida pelo meu amado pai com quem tanto aprendi, sempre com zelo por mim, entregando-me ao Márcio que me receberia por sua esposa. Um dia perfeito.
Conversei com minhas amigas, que bom que houve um tempinho pra isso.
- Mais uma etapa vencida, hein, Brenda? – Carla falou com seu sorriso que agora emanava O Espírito Santo de Deus.
- É, minha querida. Como é bom estar com vocês aqui. Que momento feliz... – chorei de emoção e elas também.
- Carla. – Alessandra olhou pra ela. – Você é outra, tá linda.
- É a beleza do SENHOR. – Carla acrescentou.
- Carla, minha querida... - Alessandra procurava conter o choro. – Eu sofri tanto por você, eu tinha tanto medo que você pudesse até se suicidar. Se você fizesse isso, você me mataria também. – Alessandra acabou de falar isso e Carla a abraçou também chorando.
- Não, Lessandra. Eu não faria isso mesmo quando tava em profunda depressão. Seria uma ingratidão com Deus e com vocês, que me trataram como seu eu fosse um neném indefeso quando tava internada. Você, Brenda, até me dava comida na boca, lembra?
- É... – eu chorei também olhando pra ela – Eu ficava feliz em cuidar de você. Foi um grande aprendizado. Já ganhei tantas vidas que tavam naquela clínica pra Jesus.
- Que bom né, Brenda? – Carla comentou com satisfação – Seu empenho em cuidar de mim, serviu muito pra eu persistir. É bem verdade que eu custei mais um pouco a aceitar Jesus, mas foi um ponto decisivo pra mim, um alerta. Eu já tinha uma consciência de que tava pecando com a minha relação com o Marcos. Sei que Deus permitiu que eu perdesse o neném, pois eu não teria condições de criá-lo com a cabeça que eu tinha e com a vida que eu levava. Eu queria abraçar o mundo com as pernas, queria driblar a vigilância dos meus pais, fui dissimulada, fingida. Eu era mesmo uma criançona querendo se fazer de mulher. Eu queria competir com todas aquelas que começaram mais cedo, como se o fato de eu ser amante de um homem casado me fizesse sentir superior a elas. A gente quando deixa de ser pura assim, antes do casamento, traz toda aquela bagagem do mundo, aquela malícia, conceitos de que toda garota tem que ter uma experiência antes e você é que vai viver agora uma grande novidade de vida. Eu entendi bem aquela passagem: “Venerado seja entre todos o matrimônio e o leito sem mácula; porém, aos que se dão à prostituição, e aos adúlteros, Deus os julgará.” (Hebreus 13 : 4), Serviu pra eu entender a diferença do que era a minha vida da sua. Sabe que eu acho que tive inveja de você? Você se posicionava desde muito cedo que queria esperar o casamento e eu achava isso uma caretice.
- Sua experiência serviu mesmo. Você hoje é nova criatura e não segue mais estes conceitos do mundo. – eu disse
- É preciso a gente quebrar a cara quando é teimosa pra aprender. – Carla admitiu
- Eu tomei uma decisão. - Alessandra disse – Depois de frequentar a igreja do Allan e ver todo o trabalho de recuperação lá e ver não só a transformação dele como também a do Beto e é claro, a sua, Carla, eu sem dúvida quero aceitar Este Deus na minha vida.
- Que máximo, Alessandra! – gritei de felicidade - Não é só meu casamento, tem um casamento com Deus aqui agora! Você é a mais nova noiva de Jesus!
Alessandra também repetiu uma oração de aceitação a Jesus e aquele dia era pra mim o mais importante em todos os sentidos. Parecia que eu ia explodir de felicidade.
Por uma pura tradição, eu joguei o buquê e quem pegou? Carla. Sei o que ela pensou quando me perguntou:
- Deve ser uma confirmação, né?
- Ai, Carla! Como eu tô feliz! Isso é sinal de Deus, pode crer! – eu gritei outra vez de felicidade.
Aquele dia era de festa no céu. Tava tudo tão perfeito e eu nem pensava que poderia ser tão mais especial do que eu imaginava. Não coloquei expectativas, simplesmente coloquei tudo nas mãos do SENHOR. Ele me presenteou de uma maneira tão maravilhosa, me reservando tantas surpresas. Meu casamento ficou mais inesquecível por isso. Minhas amadas amigas lá, comigo, Alessandra aceitando Jesus como seu único salvador e Carla tendo um sinal de Deus. Um Deus que podia perdoar e renovar tudo na vida dela que já era nova criatura e eu sentia que o SENHOR lhe dava uma nova chance desde que abriu a porta pra Sua entrada. “Eis que estou à porta, e bato; se alguém ouvir a minha voz, e abrir a porta, entrarei em sua casa, e com ele cearei, e ele comigo.” (Apocalipse 3 : 20)

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

CAPÍTULO XXXI

TE VÊEM OS MEUS OLHOS – CARLA
A vida seguia e eu pensava que ela para mim não sorria. Até rimou, mas era assim que eu vivia. Rimou outra vez, né? Hoje eu sei como vejo tudo o que passei, mas era pra passar e já passou. Minha rotina era do trabalho pra casa, de casa pro trabalho. Não aceitei mais fazer propagandas, pois não queria mais fazer parte deste meio que me lembrava o Marcos. Nem me achava mais atraente pra coisas assim. Depois da depressão braba que tive e até fiquei internada, emagreci e cortei os cabelos quase curtos, pois meu rosto tava quase sumindo. O abatimento era visível, pessoas me olhavam na rua. É como se eu dissesse a quem estivesse feliz: “Tire o seu sorriso do caminho que eu quero passar com a minha dor”. Minha fuga era o trabalho. Já era professora na academia em horários alternados durante a semana pouco tempo antes de me formar e logo depois que me formei ingressei noutro trabalho num colégio perto de casa, onde dava aulas de educação física três vezes na semana. Não queria aturar por muito tempo a companhia de minha mãe. Ela às vezes até falava um pouco melhor comigo, mas tinha dias que não dava. Quando comecei a emendar um trabalho no outro, começou a implicância. Lembro bem quando eu tava saindo um dia, ela perguntou:
- Chegou e já vai sair?
- Eu não tô no colégio também?
- Ah, é. Vê se não vai arranjar nada lá também.
- Arranjar o que?
- Sei lá, pode ser até outra barriga.
- Mãe, cê não pode ficar sem me apunhalar, né?
- Ouvir a verdade dói, hein? Você já matou seu pai, vê se não me mata de desgosto, também!
Eu ia pra porta, mas voltei e a encarei:
- Você diz que eu matei meu pai, mas saiba que se é assim, nós estamos quites, porque você matou meu filho!
- Filho de adultério!
- Foi, mas não pediu pra vir e não veio porque você matou, no exato momento que me acusou de matar meu pai!
Falei isso e saí batendo a porta.Cheguei a chorar na rua naquele dia. Como me sentia humilhada. Alguém espalhou meu caso com o Marcos. Provável que fosse alguma garota das que davam em cima dele nos eventos que ele produzia, pois havia muita cobiça e inveja naquele meio. A gente se achava tão esperto, mas a mente humana se trái e por mais que a gente pense que esconde bem, acaba deixando rastros como nós deixamos no dia da briga que ocasionou minha gravidez, “porque nada há encoberto que não haja de revelar-se, nem oculto que não haja de saber-se.” (Mateus 10 : 26).
Numa manhã que eu estava com a corda toda e já tinha um horário muito mais flexível de trabalho estava lá eu na academia dando aula de aeróbica. Tava no maior pique, eu me soltava dando aula, ainda era um dos meus pouquíssimos prazeres. De repente, percebo a imagem de alguém refletida no espelho. Quase me desequilibrei, quase esqueci os movimentos do exercício. Tive que pedir um tempo aos alunos. Parei um pouco e fui até ele:
- Marcos...
- Oi. Posso falar com você?
- Claro. Desculpe o meu espanto, mas não esperava você mesmo.
- Claro que não poderia esperar. Mas tô aqui. Só não quero atrapalhar.
- Espera só eu acabar. Eu sigo daqui com você pra um lugar onde a gente converse mais sossegado, se você quiser. Ainda tenho um tempo.
- Tá.
Paramos num bar lá perto e Marcos disse que havia voltado a morar em Paciência poucos dias antes.
- Eu quero e preciso pedir perdão a você. – ele disse com um olhar sincero, puro. Eu estava diante de um novo Marcos.
- Marcos naquele dia eu disse que não tinha o que perdoar.
- Tem sim. Eu fui obsessivo, fui mau caráter, agi como um pedófilo.
- Ei! Que exagero! Eu já tinha 18 anos!
- E eu 33. Lembra que você falou dos seus 15 anos? Não faria tanta diferença.
- Faria. Com 15 seria mais estranho, eu era uma menina, muito purinha, mas com 18 eu já era uma universitária, já trabalhava. Eu comparei a minha pureza dos 15 por que depois adquiri uma malícia que eu não tinha antes.
- Eu colaborei pra isso. Quero seu perdão.
- Tá, Marcos, se você sente assim e precisa ter este perdão eu dou.
- Obrigado.
- Não há de que. Mas por que tanta persistência em receber este perdão?
- Carla, a doença da minha mulher me ensinou muito. Ela faleceu, resistiu bem mais tempo do que era previsto, foi há um ano e meio.
- Eu já imaginava. Lamento, de coração.
- Ela era inconstante, difícil, por isso eu não acreditava naquela história de igreja. Mas os últimos tempos dela foram na presença do SENHOR.
- Eu quero dar uma parte sobre isso. Nem sei cumé esse lance de igreja, presença do SENHOR, como cê tá falando, mas eu senti muita sinceridade no olhar dela uma vez que ela passou por mim junto com seus filhos e me disse: “Jesus te ama”. Eu até pensei que Ele não poderia me amar devido aos meus maus pensamentos, porque eu já tava ficando parada em você, embora durante muito tempo tenha resistido e ficado na minha.
- Por isso que eu tinha que te pedir perdão, entende?
- Se você se sentiu melhor, isso é o que importa.
- Me senti, sim. Oro muito por você, sabe?
- Você acabou indo pra igreja, né, Marcos?
- Sim.
- Pelo seu papo eu percebi.
- Você gostaria de conhecer minha igreja?
- Olha, eu aceito conhecer, mas não tô a fim de ser crente.
- Carla, não é assim, ser crente. Você pode ter um encontro com Jesus. Eu conversei com Arnaldo. Ele gosta de você como uma filha, sabe?
- Ele sempre me tratou com muita consideração.
- Ele foi conivente comigo, ajudou-me a assediar você, mas acho que hoje se arrepende. Ele me preparou pra reencontrar você, disse que continuava sendo uma jovem bonita, mas com marcas de sofrimento. Eu soube que você ficou em depressão.
- Que mais que ele contou a você? – perguntei assustada.
- Mais nada.
- Marcos, alguém espalhou nosso caso e chegou ao ouvido até de familiares meus.
- É como cê disse no dia da nossa despedida Carla. “Nós pecamos e o castigo veio a cavalo.” Você sabe que foi usada pelo Espírito Santo pra dizer isso?
- Acho que a educação que recebi dos meus pais e desprezei por pura pirraça, me deu a noção disso. Por isso falei que pecamos.
- Mas nós pecamos. Só que não conhecíamos a extensão total desta palavra, não pensávamos nas conseqüências do pecado.
- Eu acho que senti os efeitos e ainda sinto. Marcos, eu preciso contar uma coisa antes que você possa saber por outros e agora eu é que peço seu perdão.
- O que?
- Eu perdi um filho seu. A princípio, nem lembrei como fiquei grávida. Depois lembrei que foi em decorrência de uma briga nossa quando a gente tava de porre. A briga começou lá embaixo nos bastidores daquele show no Centro e acabou naquele quarto que a gente ficava, lembra?
Marcos ficou em silêncio, abaixou a cabeça. Depois olhou muito terno pra mim e disse:
- Claro que você tá perdoada, meu bem. Deve ter se sentido muito só. Agora que cê falou, eu visualizei tudo. A gente se achava tão esperto, né? Você bem lembrou na última vez que nos falamos que chegamos a nos comportar como irracionais. Eu cheguei a ser violento contigo.
- Não se preocupe, não foi tanto assim, o homem carinhoso que sempre foi superou aquele momento e isso entrou no “pacote do perdão” que eu dei. Eu queria ter o filho e você poderia me pedir pra abortar, então não falei logo por medo. Depois, você contou sobre sua mulher e eu quis que fosse embora em paz, sem mais nada que o prendesse a mim.
- Eu entendo sua posição. Mas um dia a verdade tem que aparecer. Pra você ver como minha mulher tava preparada pra ir pro SENHOR, ela soube de nós e nos perdoou, disse que se eu a visse novamente que falasse isso a você e que lembrasse que acima de tudo Jesus ama você.
- Pôxa...ela devia estar preparada mesmo.
- Carla, aceita o convite pra ir à minha igreja hoje à noite?
- Tá, eu aceito. Minha amiga Brenda já é crente há quatro anos, já me chamou tanto.
- Tá aqui o folheto.
- Agora eu não tenho desculpa pra não ir, é bem perto.
Naquela noite eu fui. Ouvi a pregação, acompanhei ao lado do Marcos pois eu nem tinha Bíblia. A palavra que foi pregada, eu lembro até hoje, foi em Jó. Ficou marcada na minha mente, tinha tudo a ver comigo: Com o ouvir dos meus ouvidos ouvi, mas agora te vêem os meus olhos. (Jó 42 : 5). Como eu chorei. Nem pensei mais, fui lá na frente e aceitei Jesus aos prantos. Senti um alívio, uma paz depois que chorei uma catarata de lágrimas jorrando de mim, como se os rios de água viva do Senhor estivessem lavando e expulsando todo o mal da minha vida. Fiquei tão feliz, que cheguei em casa e falei com minha mãe.
- Mãe, vem aqui, por favor.
Ela veio até a mim, desconfiada, achou que eu ia dar um acesso, até bater nela, pois tava no impacto da briga ainda recente. Ela veio e eu a abracei forte. Eu disse chorando:
- Mãe, me perdoa do que eu disse, que você também matou meu filho, eu tava com raiva. Eu encontrei o pai do meu filho e aceitei Jesus. Ele tá na igreja, a mulher dele morreu.
- Carla...há quanto tempo você não me abraçava. Me perdoa também minha filha. Você ficou internada tanto tempo e eu ainda achei bem feito. Alessandra brigou tanto comigo, a Lúcia também. Você deve muito a essas amigas. Elas são fiéis. Eu como mãe não consegui ser o que elas foram pra você.
- Não se culpa não, mãe. Você e meu pai aceitaram assinar contrato pra propaganda achando que não tinha nada demais. Escondi muita coisa de vocês, errei, mas tô sinceramente arrependida. Agora tô com Jesus e não abro.

terça-feira, 24 de novembro de 2009

CAPÍTULO XXX

QUATRO ANOS DEPOIS – ALESSANDRA
Enfim formadas. Eu já professora da academia e também trabalhando por minha conta como personal trainer pras dondocas de Ipa. Eventualmente aparecia em revistas sobre modas de esporte e verão. Embora meus pais pudessem me dar um imóvel pra que eu trabalhasse mais por minha conta, eu preferi não depender deles, não por orgulho, mas como uma retribuição do muito que fizeram por mim. Brenda foi um exemplo neste sentido pra mim. Ela tava noiva! Valeu a espera. Um rapaz educado, gentil, cavalheiro, um exemplo pra muitos outros. Eu continuava nos meus desencontros. Não pensava em ter um marido homem com quem compartilhasse uma vida. Brenda dizia: “Deus vai dar o seu varão.” Mas eu não tava nem aí. Achava que casamento era uma instituição mais do que falida e tinha medo de relacionamentos duradouros, intensos.
Carla estava melhor, mas seu rosto não expressava alegria, parecia a personificação de uma música antiga que meu pai escutava às vezes: BOM DIA TRISTEZA. Ela tinha uma vida normal, fazia o que tinha que fazer, ia vivendo, mas era triste, todos reparavam. Depois da morte do pai, ela ficou com tanta depressão que teve que ser internada um tempo em uma clínica psiquiátrica. Eu e Brenda íamos regularmente visitá-la. Enchíamos-nos de coragem, Brenda orava antes, eu nem sabia orar, mas aceitava e concordava. Era duro agüentar o tranco enquanto estávamos lá. Brenda aproveitava pra evangelizar, lia a Bíblia pra outros internos e eles se alegravam com a presença dela, que, mesmo depois de Carla ter saído, continuou com esse compromisso. Nós animávamos Carla, éramos carinhosas, paparicávamos nossa amiga, desejando que ela saísse logo. Brenda era um anjo com ela. Tratava Carla como um neném, fazia carinho, abraçava, dava muitos beijos naquele rostinho que tava sumindo de abatimento, dava comida e depois ainda ficava com ela, fazendo carinho nos cabelos dela, que estavam mais curtos, até dormir. Brenda dizia coisas tão lindas pra Carla:
- Florzinha do jardim do meu coração. Tô aqui pra regar você. Jesus te ama e eu também.
Na saída, eu procurava um canto e o ombro de Brenda pra chorar, pois me doía tanto ver a Carla com aquele olhar parado, cabeça baixa. Brenda me consolava e dizia que em breve ela sairia. Carla às vezes chorava, o que era até bom, pois muitas vezes nem isso ela conseguia. Ela atrasou-se um período na faculdade, pois não tinha condições de voltar logo. Houve compreensão e consideração no trabalho também. Ela teve uma licença e depois voltou a trabalhar. Antes de se formar, já trabalhava como professora na academia. Quando se formou, távamos lá eu e Brenda aplaudindo na primeira fila.
- Parabéns, amiga. Jesus te ama e eu também – Brenda a abraçou.
- ‘Brigada. – Carla agradeceu tentando sorrir
- Cê lembra do Márcio, meu noivo? – Brenda apresentou
- Ah, oi, ‘brigada por ter vindo também.
- Parabéns, Carla. – Márcio a cumprimentou
- Vamos comemorar? – eu convidei
- Tá meio tarde. – Carla não se animou
- Ah, Carla, é por minha conta. – eu insisti
Acabei convencendo o pessoal e banquei junto com minha mãe um jantar informal numa pizzaria lá perto. Jacyra estava na formatura da filha por pura obrigação. Os rancores eram óbvios entre as duas. Quando Carla foi ao toalete, aproveitei pra falar com Jacyra.
- Jacyra, eu sei o quanto você sofreu com a perda do seu marido, mas a vida continua, sua filha tá viva.
- Espero que ela tenha aprendido a lição da vida.
- Ela sofreu muito.
- Cabeça não pensa, o coração padece.
- Jacyra, será que você nem para pra pensar o quanto foi horrível o tempo que ela ficou na clínica? Ela, nem tá curtindo a formatura. Ainda mais você com essa cara de enterro. Se alegra, mulher! Tua filha tá formada. Superou uma depressão e tem gente por aí que até se suicida! Tô te desconhecendo! Tá ficando amarga e cruel!
Nada do que eu falasse ia adiantar. Jacyra não disse um parabéns à filha, ficou mais calada que ela. Minha mãe chegou a chamar a atenção de Jacyra, disse depois pra mim que teve vontade de virar a mão nela por ver tanta frieza. Eu pelo menos fiquei feliz por oferecer um jantar pra quem sempre foi, é e sempre será tão importante na minha vida. Nós éramos inseparáveis e embora as circunstâncias vida tentassem nos separar, nunca deixamos nossa amizade morrer, porque ela vai pra eternidade.
Ainda pensando muito sobre os últimos acontecimentos, feliz por uma amiga que estava noiva e triste por outra que queria ver feliz também, estava eu numa manhã ensolarada de domingo passeando na rua fechada de Ipa próximo à praia, quando avistei alguém conhecido na direção contrária.
- Allan! – eu gritei
Ele acenou pra mim e veio ao meu encontro.
- Oi, que bom te ver. – Allan veio sorridente
- Pois é, depois de tanto tempo.
- É, 5 anos.
- Cara, eu me formei. Trabalho lá na academia, sou personal trainer. E você, como tá?
- Tô numa ótima! Montei uma academia de surf. Preparo um pessoal lá em Floripa durante um ano pra competir. Um grupo de garotos e garotas, entre 17 e 18 anos, logo depois de acabar o 2º grau, competem e um garoto e uma garota são selecionados pra competições em circuito internacional, no Chile, Marrocos Indonésia, Austrália, Havaí, conforme for a oportunidade. Eu fico com pena de ter que escolher tão poucos, todos são muito bons, mas não tem lugar pra mais, fica muito caro.
- Ah, mas que legal, Allan! Você sempre gostou de surf, mas eu não pensava que ia levar tão a sério.
- Surf é uma arte, mas também é disciplina. Lá onde o pessoal fica, eles aprendem além das técnicas, o mais importante: a união, o espírito de grupo, as tarefas de casa, arrumar quarto, roupa, fazer comida. Enfim, a disciplina e o bem estar do grupo dependem do compromisso de cada um.
- Pôxa, é difícil ver uma coisa dessas aqui no Brasil.
- Pois é. É um modelo americano. Mas tem dado certo. Eu não sabia usar o dinheiro, mas agora eu sei.
- Mas é só isso ou tem mais coisa? Você casou?
- Não, tô esperando em Deus.
- Como?!
- Eu agora sou crente. Na academia ensino também a todos a palavra de Deus.
- É?!
- É.
- Uma amiga minha, a Brenda, você lembra?
- Ah, acho que sim, tava no seu aniversário de 18 anos.
- Ela também é crente há 4 anos. Tá noiva, vai casar.
- Glória a Deus!
- Ai, Allan, quem diria, eu te encontrar aqui agora. Pensei que você ia ficar com a Adriana.
- Não durou muito. Outras apareceram, mas tudo ilusão. Eu não casei, mas tenho uma filha.
- É?
- Ela tá com 3 anos. Foi um lance rápido, mas pelo menos valeu pela minha menina.
- Qual é o nome dela?
- Natália.
- Belo nome.
- É a minha bonequinha, Natalinha.
- Pôxa, Allan, foi bom mesmo te ver.
- Ah, antes que eu esqueça você tem também outra amiga...
- Carla.
- É. Como vai ela?
Quando ele perguntou isso, eu quase chorei.
- Allan, ela tá até bem, se formou, outro dia foi a formatura dela, mas...
- Mas?
- Ela não tá feliz. Eu fico sempre pensando no que fazer, até levei pra jantar fora no dia da formatura.
- Ela teve algum problema sério?
- Vários, mas é melhor não falar, não quero trair a confiança dela. Entre outros problemas houve o falecimento do pai dela.
- Lamento.
- Allan, eu tenho que ir, mas se você acredita mesmo neste Deus que a Brenda também acredita pede a Ele pela minha amiga. Brenda e Carla são muito importantes pra mim. A Brenda tá até muito bem, mas sei que como eu, não pode se sentir totalmente feliz se a Carla também não estiver feliz.
- Você tem esta grande qualidade que eu aprecio muito Alessandra. A amizade. Uma coisa difícil de encontrar hoje em dia.
- Allan, só mais uma coisa: você sabe do Beto?
- Claro que sei, ele é da minha igreja.
- É?!
- Ele se libertou do álcool, das drogas e faz parte de um ministério pra libertação de qualquer vício, ou dependência emocional lá na igreja.
- Pôxa...cês devem fazer um trabalho bonito lá.
- Você pode dar a honra da sua visita. Tá aqui um folheto. Neste período eu tô aqui. Nesta fase do ano ainda dá pra ficar um pouco aqui e lá. Depois volto pras eliminatórias e pra selecionar os alunos do próximo ano.
- Pôxa, boa sorte, querido. Foi mesmo muito bom te ver.
- Digo o mesmo. E lembre-se: Jesus te ama.
- Amém! Té mais!
Fiquei surpresa com a mudança do Allan. Que sorriso sincero, que expressão de felicidade, de amor. Foi tão gentil e senti que ficou sensibilizado quando falei da Carla. Até pensei nela, quando ele falou que o Beto havia se recuperado e que o trabalho deles na igreja não se restringia a viciados. Sei que a Carla procurava outro tipo de ajuda nuns grupos anônimos lá mesmo pela zona Oeste, mas depois entendi que a doença de minha amiga era na alma.

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

CAPÍTULO XXIX

SEMPRE INTERCEDENDO – BRENDA
Entrei em casa arrasada. Carla, minha querida amiguinha, sofrendo tanto. Sentia-me impotente, mesmo perseverando em oração por ela. Chorei horas, orei e pedi muito a Deus pela vida dela. Minha mãe bateu na porta do quarto:
- Brenda, filha, vem jantar.
- Não tô com fome, mãe, obrigada.
- Você tava chorando, né?
- Ainda tô.
- Minha filha, que coisa triste. - minha mãe me abraçou.
- Eu queria ter conseguido falar mais com ela, ter aconselhado, ajudado a evitar todo este sofrimento.
- Você é uma amiga fiel, minha filha, não se cobra tanto. Ela tava com a vida dela lá. Antes os pais a prendiam muito e lá ela se soltou demais, não teve cabeça, acabou ficando perdida.
- Mãe, amanhã eu vou lá outra vez, quero ver o Valdemar no CTI.
- Que tragédia! Ao mesmo tempo o pai e a filha. A Carla tá um pouco melhor?
- Ela vai receber transfusão de sangue, ainda tá fraca, vai se recuperar fisicamente, mas emocionalmente tá péssima.
- Eu imagino.
Fui ao hospital no dia seguinte e entrei no CTI. Cheguei bem perto do Valdemar que ainda tava em coma
- Valdemar, se você tá me ouvindo, pisque o olho esquerdo.
Ele piscou.
- Valdemar, querido, Jesus te ama e quer que você perdoe sua filha e se entregue a Ele. Você quer aceitar Jesus e mesmo em pensamento repetir uma oração? Se sim, pisca outra vez o mesmo olho.
Ele piscou outra vez. Orei com toda fé como se fosse ele falando:
- SENHOR DEUS, creio que tu és o criador dos céus e da terra e que deste Teu amado Filho Jesus para que toda a humanidade fosse salva. Eu entrego minha vida a ti. Perdoa os meus pecados e escreve o meu nome no livro da vida. eu te agradeço em nome de Jesus. Amém.
Fui pra casa e depois pra faculdade. Quando voltei, minha mãe disse:
- Valdemar faleceu. Seu pai foi ao velório.
- E a Carla?
- Ela ainda tem que ficar mais um pouco no hospital, tá muito fraca. O médico que a está assistindo disse que ela tá com uma depressão muito acentuada. Não quer comer, tá passando só a soro. Não fala, nem chorou com a notícia da morte do pai. Tá completamente apática. Estão dopando a menina direto, pois temem que ela possa até se suicidar.
- Coitadinha...eu vou fazer tudo o que eu puder por ela. Jacyra disse que ela matou o pai quando ele enfartou.
- Que horror! Uma mãe dizer isso a uma filha!
- Mãe, eu vou ao velório.
- Vamos de manhã ao enterro, filha, agora tá tarde.
- Tá.
- Alessandra já tá lá.
Fomos de manhã e falei com Alessandra:
- Como vai ser agora, hein?
- Ai Brenda, nem me pergunte. Ele deixou as duas bem financeiramente, mas acho que Jacyra e Carla não vão mais se entender.
- Tá tenso o clima, né?
- Eu fui ver a Carla. Ela não fala. Jacyra só diz que ela matou o pai. O pessoal conhecido, parentes, aqui mesmo no velório fez comentários que só falta quando verem a Carla atirarem pedras nela.
- Meu Deus, quanto julgamento! Então souberam do caso dela com o Marcos?
- Eu acho que sim. Pelos comentários que ouvi. Sempre tem um dedo duro nessas histórias.
Quando voltei pra casa, li aquela passagem da mulher adúltera, na qual Jesus diz aos fariseus: “Aquele que de entre vós está sem pecado seja o primeiro que atire pedra contra ela”. (João 8 : 7-b). Pensei muito na Carla, marcada pela incompreensão das pessoas que muitas vezes são falsas moralistas, julgando os outros como se fossem santas. Mesmo tendo errado, a mulher adúltera recebeu na hora o perdão de Jesus que disse: “vai-te, e não peques mais.” (João 8 : 11-b). Contei à dona Maria, que teve muita compaixão.
- Pobre dessa menina. Ela precisa muito de Jesus.
- O clima tá tão pesado na família.
- Minha filha, ora, ora sempre. Jesus vai se manifestar na vida dela no momento certo. Na passagem da mulher adúltera Ele tava lá em socorro dela e dando o alívio do perdão e a encorajando a seguir em frente sem repetir o erro. Sua amiga ainda vai sentir isso. Pode parecer que vá demorar e eu sei que você deseja que ela esteja com Jesus agora e se liberte, sei que você sofre por isso. Mas vamos orar, Deus vai responder e vai chegar o momento que ela vai ouvir.
E assim, sempre intercedendo, tive além da dona Maria outras pessoas que me acompanhavam em oração, auxiliando-me a suportar aquela dor. Uma pessoa muito especial que eu ainda conhecia pouco tocou meu ombro quando eu tava recolhida em oração ajoelhada, chorando no banco da igreja.
- Oi. – ele falou mansamente
- Oi... Eu virei pro lado e respondi baixinho, com a voz embargada pelas lágrimas
- Desculpe, eu não queria interromper, mas é que eu tenho visto você sempre orando, você faz parte da interseção, né?
- É. Eu também tenho visto você no grupo de jovens, no teatro cristão.
- É. Eu tô me formando ator pelo curso aqui da igreja. Meu nome é Márcio. Você pode falar por que tá tão triste ou é algo muito particular?
- Eu até devo, assim você me ajuda em oração. Uma amiguinha minha tá sofrendo muito... – comecei a chorar mais e ele ficou emocionado também. Relatei sem contar todos os detalhes o que houve com Carla, a perda do pai, a depressão.
- Pôxa...é duro sim, já sofri assim por amigos meus. Uma vez eu e outros amigos encontramos um que não víamos há algum tempo na rua. Nós nem tínhamos programado isso, mas olha como Deus faz as coisas: do nosso grupo de amigos era o único que ainda não tava na igreja. A gente tava evangelizando na rua, lembro que era no finzinho de 85, num sábado. Ele tava de porre, chorando muito. Primeiro conversamos com ele. Todos nós o abraçamos. Eu até me emociono de lembrar o que ele falava:
- Eu não tenho mais razão pra nada na vida, eu quero morrer!
- Eu falei pra ele: Que é isso cara, a gente tá junto não vamos te deixar nunca. Você tem chance, tem quem te ame e que tá vendo você agora aqui: Jesus. Levamos o cara pra casa de um desses amigos que tavam com a gente. Cuidamos dele ele tomou um banho, um café forte, ele ficou sóbrio e depois de conversarmos com mais calma, fizemos o apelo que ele aceitasse Jesus e ele declarou que Jesus era o seu único salvador. Hoje ele tá no ministério de cura aqui da igreja.
- Que bom. Quero ver minha amiguinha assim. Eu amo demais a Carla...tô sofrendo tanto... – eu chorava muito
- Não fica assim. Você crê que ela vai ser liberta? Que Deus vai operar na vida dela?
- Creio.
- Vamos orar juntos.

sábado, 21 de novembro de 2009

CAPÍTULO XXVIII

OLHO NO OLHO – CARLA
No fim do mês minha regra não veio. Num intervalo no trabalho comprei o teste de gravidez numa farmácia e deu positivo. Liguei pra Alessandra e falei que as suspeitas estavam confirmadas. Pedi que ela assim que pudesse se comunicasse com a Brenda. Duas semanas depois atendi ao telefone na academia.
- Alô?
- Carla.
- Oi, Marcos.
- Meu amor, me perdoa o sumiço, mas não posso contar por telefone o que aconteceu. Posso te pegar na faculdade hoje?
- Pode.
- Tá, eu tenho muita coisa pra dizer pra você. Tem que ser olho no olho.
- Concordo, Marcos, olho no olho.
- Eu te pego lá e vamos pra aquele bar no Centro, tá?
- Tá.
Liguei pra Alessandra e pedi um apoio a ela. No telefone, ela perguntou:
- Vai contar pra ele?
- Eu nem sei o que vou ouvir. Tudo vai depender do que ele disser.
Esperei o Marcos. Alessandra chegou antes. Quando o Marcos chegou, ela estacionou seu carro e nos esperou por perto. Depois ela me deixaria em casa.
Chegamos ao bar e Marcos estava sério. Em poucos segundos lembrei de vários momentos intensos ao lado dele que eu sentia como um tempo de ilusão terminando na minha vida.
- Pode falar, Marcos.
Ele ficou de cabeça baixa e depois tentou falar dominando a emoção:
- Minha menina...nunca pensei que precisaria dizer isso, mas...
- Você veio se despedir de mim, tô certa?
- É...
- Você quer me contar por quê? Se não quiser, eu vou entender.
Marcos chorava e eu não imaginava por que, mas ele conseguiu dar uma pausa e falou:
- Minha mulher tá com uma doença grave e foi descoberta já um pouco avançada.
Eu fiquei perplexa. Toquei a mão dele.
- Marcos...eu...nem sei o que dizer. Olha, de coração, eu nunca quis o mal dela. Ela me tratava tão bem que eu depois que me envolvi com você não teria nem cara pra olhar pra ela. Mas você tá certo. A mim, não deve nada, só a ela. É seu dever cuidar dela. Da minha parte não há mágoas, tá tudo bem, querido. Foi bom enquanto durou, mas nós pecamos.
- Que é isso, Carla?
- É verdade Marcos. Nós pecamos e o castigo veio à cavalo. Enquanto nos curtíamos numa boa, ela já devia estar doente sem o apoio que precisava. Fomos muito egoístas.
- Eu vou ter que vender minha casa e meus parentes e os dela vão ajudar pra ela fazer tratamento. Não tem cura, mas tem chances de viver mais de um ano.
- Marcos, vai em paz. Não sofre por nós. Sua atenção agora tem que ser pra ela. Eu sou muito nova, tenho uma vida pela frente. Eu supero isso. Você tem mulher e filhos, eles são sua obrigação.
- Eu prejudiquei você.
- Não, não pensa assim. Vou lembrar sempre com carinho de você. Sabe Marcos, eu tenho 18 anos, mas parece que com isso tudo eu ganhei mais 10. Você é um homem maduro, que parece até mais jovem de aparência e no jeito de ser também. Muitas vezes me diverti com seu jeito malandrinho, brincalhão. Vou sentir saudade. Eu lembrei agora de quando fiz 15 anos. Eu nem sabia que você existia, mas naquele tempo você tinha exatamente o dobro da minha idade. Eu era uma menina, hoje sou uma mulher. Minha festa de 15 anos foi inesquecível, como eu era feliz e não sabia! Até sabia, mas não o quanto era feliz. Comparando hoje, eu sei que por você ser muito mais velho do que eu, muitas vezes não teve paciência comigo quando eu ficava irritada, com ciúmes, sei que parecia uma menina mimada. A gente fez muitas loucuras. Agimos como seres irracionais, sem pensar, deixando as emoções explodirem. Mas eu aprendi. Com certeza o que errei lá atrás, vai servir pra que eu não faça igual mais pra frente.
- Eu queria fazer uma despedida diferente.
- Eu também, você sabe, mas é melhor não. É melhor ficarmos por aqui, sem nos tocarmos, pra eu não querer te prender nos braços e não te deixar ir, porque não tenho nenhum direito sobre você. Eu fui a outra. Por mais que você tenha tido a ilusão de que fui sua porque tirou a minha pureza, eu nunca fui, porque você também nunca foi meu. Não somos um do outro, mas você é da sua mulher e deve viver pra ela. O que posso dizer é que nunca vou te esquecer e quero que seja muito feliz. Adeus, Marcos.
Levantei me preparando pra sair
- Carla. – Marcos chamou
- Querido, deixa como tá. Não tô com mágoa, só tô triste, é natural.
- Me perdoa.
- Não tem do que, Marcos. Eu que peço perdão por ter sido tão fraca e ter deixado acontecer. Você poderia ter dado mais atenção à sua esposa, teria descoberto antes a doença dela. Fui eu que prejudiquei sua vida, não você à minha. Deixa eu ir embora, por favor, pra não ser mais difícil. Vou encontrar a Alessandra. Adeus, querido.
Eu fui sem olhar pra trás, correndo tentando segurar o choro. Fui até Alessandra e desatei a chorar nos braços dela.
- Você contou?
Mexi com a cabeça que não.
- Ele se despediu. A mulher dele tá muito doente, o que eu podia fazer? Aceitar...não podia falar da gravidez numa situação dessas. Ele tava arrasado.
- Eu sei que você ainda vai sofrer muito, mas um dia vai esquecer tudo.
- Eu não consigo esquecer dele.
- Eu sei...chora Carla.
- Lessandra...
- Quê?
- Eu acabei de falar com o Marcos que a gente já agiu muito sem pensar, como irracionais. Isso me fez lembrar. Foi assim que eu engravidei. Nós dois távamos de porre. Eu tava numa fase péssima, com TPM, cheia de ciúmes do Marcos, achei que uma garota tava dando em cima dele, num show que ele tava produzindo, ele me levou prum quarto onde nós ficávamos e a briga esquentou mais e aconteceu tudo sem o menor controle. Eu, com ciúme daquele que nunca foi realmente meu. Eu me esquecia de tudo e devo ter esquecido de tomar pílula, por que agora eu lembro que com certeza ele se descuidou naquele momento. Foi por acidente, mas não importa, mesmo assim e ainda mais agora eu quero este filho.
Nos dias que se passaram em casa o meu estado ficou cada vez mais evidente. Enjôos logo que eu acabava de comer, tonteiras e a falta dos absorventes. Numa noite eu tava em casa, não fui à faculdade, pois a tensão que eu passava intensificava os sintomas. Eu não sabia como falar, mas também sabia que um dia iriam me perguntar e foi o que minha mãe fez naquela noite, aproximando-se de mim e segurando forte o meu braço:
- Carla, diga a verdade, você tá grávida.
Fiquei aterrorizada. Ela me olhou com um olhar de ódio, condenação, como nunca havia olhado antes.
- Eu... – perdi a voz, cheguei a ficar rouca de nervoso.
- Diga a verdade, menina, por isso que você vinha chegando tão tarde da faculdade e nos fins de semana nem dormia em casa! – ela me segurou mais forte
Meu pai apareceu na sala e perguntou:
- Que tá havendo aqui?
- Você não vai falar? – minha mãe me pressionou
- Eu...eu tô grávida!
- O QUE?! – meu pai gritou – Quem foi o cafajeste?!
- Calma, Valdemar! – minha mãe recomendou
- Calma uma conversa! Essa menina é uma decepção! Eu confiei, permiti que ela aparecesse em propaganda, achei que era pra ganhar dinheiro decentemente! Ela se suja e ainda suja o nome da nossa família desse jeito?! Se comportando como uma vagabunda qualquer! Eu consegui tudo o que consegui com luta! Eu tenho honra! Na minha família nunca aconteceu isso! Dei estudo pra essa menina pra que?! Pra que ela arranjasse barriga do primeiro que aparecesse?! Você é uma vergonha! Você...
Meu pai ficou no auge da cólera, senti pelo jeito dele que ia até me bater, mas arregalou os olhos e caiu no chão. Eu fiquei paralisada. Minha mãe gritou:
- Você matou seu pai!
Assim que ela disse isso, só lembro de sentir uma dor imensa no meu ventre e o sangue descer. Dei um grito de dor e quando abri os olhos vi Brenda à minha esquerda e Alessandra à minha direita. Eu estava na cama do hospital e minhas amadas de plantão, esperando que eu voltasse a mim.
- Brenda...Alessandra ...eu...
- Calma, Carla, nós tamos aqui com você, sempre vamos estar. – Alessandra disse e acariciou minha cabeça.
- Eu...perdi...né? – chorei perguntando à Brenda
Brenda chorou e fez com a cabeça que sim.
- Não é justo! A única lembrança que eu ia ter dele! – chorei desesperada
- Calma, meu amor. – Alessandra me confortou, segurando as lágrimas, me abraçando.
Eu queria gritar, sair correndo, queria me jogar da janela, ou debaixo de um trem. Minha revolta era tanta que eu queria ter um acesso, bater em alguém, mas não tinha forças. Chorei descontroladamente e Brenda me abraçou forte, também, chorando muito comigo. Depois, lembrei e perguntei:
- E o meu pai?
- Tá no CTI – Brenda respondeu.
- Ele tá em coma ainda – Alessandra disse
- Você tem que se poupar. Seu estado ainda requer cuidados. – Brenda argumentou, também segurando o choro, como Alessandra
- Eu quero morrer!!
Brenda ficou orando baixo segurando minha mão esquerda enquanto Alessandra segurava a direita e senti um consolo, mas continuei em profunda depressão. Foi como se eu tivesse morrido. Meu pai continuou no CTI em coma.

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

CAPÍTULO XXVII

REVIVENDO O PASSADO – ALESSANDRA
Domingo levei Carla à praia. Consegui vê-la sorrir um pouco e isso foi bom. Não demoramos muito, o sol tava muito forte, ela ficou tonta. Tive medo que passasse mal. Eu não tinha experiência com gravidez, mas pelo que eu conhecia, ela estava com fortes sintomas de uma. Ao chegar em casa, tivemos uma grata surpresa: Brenda tava lá, esperando a gente. Carla abraçou-se com ela e eu também, mas Carla demorou mais no abraço, chorou, tava muito sensível. Pediu perdão à Brenda, pois tava muito envergonhada de ter falado com ela daquele jeito ao telefone. Ela sorriu pra ela e disse que não pensasse mais naquilo. Carla falou de seus sintomas de gravidez pra Brenda que a apoiou quando disse que ia ter o neném. Eu continuava preocupada com a reação dos pais dela, pois ela não poderia esconder muito mais tempo deles. Mesmo antes que a barriga crescesse, os enjôos, a falta dos absorventes já seriam sinais. Estávamos nós, lá juntas, revivendo o passado, como nos bons tempos. Conversamos sobre nós, como estávamos desde que nos separamos depois de tantos anos tendo compartilhado tantas coisas juntas. Foi um festival de risos e lágrimas. Lembramos nossos antigos aniversários, vimos fotos da gente pequenininha, fotos que eu tenho delas até hoje com dedicatórias. Eu tava sozinha naquele período, mas feliz por estar com a Brenda e a Carla. Precisava resgatar toda a essência daquela amizade que não poderia se perder por causa da distância. Nossas vidas eram unidas demais pra gente viver tanto tempo separadas. Antes que escurecesse eu levei as duas pra casa. No caminho a gente foi conversando, apreciando cada lugar por onde passava. Brenda ficou preocupada que eu gastasse muita gasolina.
- Pra ficar mais tempo com vocês, eu paro no posto e encho mais o tanque! – respondi sem pensar.
Eu tava amando estar com elas. Parecia uma eternidade aquele tempo que a gente ficava sem se ver. Brenda falou da igreja, pareceu estar gostando mesmo e eu senti que a vida dela já tinha muito a ver com toda aquela visão de igreja evangélica. O lance de esperar o casamento pra se entregar ao homem. Ela disse que não tava nem com pressa de ter ninguém.
- Não teve nenhum flerte na igreja? – perguntei, mas sem malícia.
- Não – ela respondeu – Os rapazes lá são muito diferentes. Lá tem grupo de jovens, tô começando a participar.
- Você vai conhecer alguém que goste de você. – Carla falou como quem desejasse à Brenda mais sorte do que ela teve.
- Você também ainda vai saber o que é isso, Carla. – Brenda falou sorrindo pra ela, com sincero desejo
Não tocamos mais no assunto da provável gravidez de Carla até que Brenda ficasse em casa.
Aquele dia foi o “show”, mesmo com a tensão da Carla. Brenda parecia irradiar alegria, a gente sentia uma paz vinda dela, uma coisa tão doce, tão natural. Ela tava diferente, mas pra melhor. Não digo que a Carla estivesse diferente pra pior, mas tava muito sofrida. Eu e Brenda continuávamos preocupadas, pensando em como ajudar. Eu até me perguntei: “Será que os pais da Carla botam ela pra fora de casa se ela estiver grávida?” Mas procurei não pensar no pior e dar apoio pra ela, pois era o que ela precisava.
Já tava escuro quando deixei Brenda em casa e ela despediu-se de mim e depois de Carla olhando com o maior amor pra ela, bem nos olhos e dizendo:
- Conta comigo sempre. Meu coração tá no seu.
Carla chorou abraçada a ela e nem conseguiu dizer nada. Brenda olhou pra ela sorrindo, deu um beijo no rosto dela e acariciou seus cabelos como se fosse uma criança. Carla tava muito tocada com o carinho de Brenda. Nós ainda conversamos mais um pouco.
- Cê não quer parar em algum lugar pra comer, Carla?
- Nem posso ouvir falar em comida.
- Não precisa de alguma coisa pra confortar o estômago?
- Eu ainda tenho que descobrir se estou confortando alguém aqui dentro.
- Você parece preocupada, mas por outro lado quer o filho.
- Claro que quero. É um pedacinho do Marcos em mim. Eu errei, mas pelo menos fica uma compensação.
- Ele não tem dado notícias, né?
- Eu perguntei pro seu Arnaldo. Ele disse que ele tá com uns problemas. Não sei se são com a mulher dele ou com os filhos.
- Vocês estiveram mais tempo juntos, ele antes já não parava em casa. Ela pode estar desconfiada. Pode até não cogitar que seja você, mas que ele tem outra.
- Não tenho mais visto ela por perto da academia. Nem teria cara pra olhar pra ela. Sempre falou tão bem comigo. Por que as coisas acontecem assim?
- Calma, Carla, não começa a se torturar.
- Mas Lessandra, eu tô pagando pelo meu erro. Se estiver mesmo grávida, quero ter o filho, mas eu errei. Ele nunca disse que largaria a mulher. Eu tinha que ter fugido, sumido. Eu fui culpada. Ele soube como me seduzir, me atrair e eu fui fraca. Marcos foi esperto e agora eu sei que tô correndo o risco de ficar sem ele.
- Você pensa em contar pra ele se descobrir que tá grávida?
- Eu não sei...ele pode até querer que eu tire, tanto homem age assim quando descobre que a amante tá grávida.
- Será que ele é tão frio assim?
- Lessandra, o seu Arnaldo tem um filho com outra mulher e esse filho é menor que os dele com a esposa. Neste caso foi diferente, mas não são todos assim. O que eu posso esperar é que o Marcos seja como a maioria dos homens. Ele tem suas diferenças, mas tem características comuns a todos os outros. Ele tinha uns olhares de cumplicidade com seu Arnaldo. Neste ponto ele é como todos. Por um lado tô achando melhor este sumiço, embora eu esteja sofrendo, tô tendo tempo pra pensar.
- Então nem sabe o que vai falar com ele?
- Ainda não, vai depender do que eu souber quando ele resolver aparecer. Mas ele deve estar mesmo com algum problema sério, se não, não sumiria tanto tempo.
- Como você em poucos meses se envolveu tanto com aquele homem.
- É. Passamos momentos bons, mas isso foi só ilusão. Talvez eu alimentasse a esperança de ficar com ele, mas não tenho nenhum direito. Bem feito pra mim.
- Não precisa se auto-flagelar também!
- Lessandra, a Brenda tá certa. Ela é a certinha, mas tá feliz.
- Você tem razão. A gente alimenta muita ilusão mesmo. Tô sozinha um tempo por causa disso. Brenda parece mesmo feliz.
- Os sentimentos da gente são intensos demais. A gente não pensou. Nem eu pra me deixar dominar pelo Marcos e você pela sua carência e seu medo dos relacionamentos. Não soubemos esperar.
- Eu tô tentando ser diferente.
- Eu não tô conseguindo ser. Tô assim, tão amargurada com tudo isso...
Carla começou a chorar. Estávamos algumas quadras antes da casa dela. Parei o carro e a abracei.
- Ah, minha linda, não fica assim. A gente até que teve um dia bom com a Brenda, ela foi tão carinhosa contigo. Você tem a gente, meu amor. Não sofre assim. Carla os erros da gente servem de experiência pra gente não repetir mais tarde.
- Mas eu fui muito longe.
- Carlinha, a gente tá perto da sua casa, você precisa se acalmar. Chora o que tiver que chorar, eu deixo você lá, fico um pouco e você procura não remoer mais isso tudo na cabecinha.
- Eu vou tentar.
Deixei Carla em casa e ainda fiquei um pouco. Procurei conversar também com ela pra que tirasse um pouco os problemas da cabeça. Até aquele dia, seus pais ainda não haviam percebido nada. Mas a Jacyra chegou a comentar que achava muito calada e que estranhava muito ela não se enturmar mais, não namorar, não se chegar aos rapazes da idade dela. Disse que achou um exagero aquela maratona de eventos que ela participou naqueles primeiros meses do ano, período aliás que deve ter resultado naquela provável gravidez. Pediu-me que a aconselhasse. Disse que estivemos com a Brenda e ela perguntou dela e eu disse as novidades.
- Aquela sim tem juízo! – Jacyra elogiou Brenda. – Minha filha quer fazer tudo ao mesmo tempo, não sossega!
Despedi-me de Carla dizendo:
- Te cuida, hein? E dá notícias.
Achei Carla menos tensa depois de me despedir, mas minhas preocupações continuavam. Eu torcia que ela não estivesse grávida, que fosse um rebate falso.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

CAPÍTULO XXVI

SINAIS – CARLA
Meu relacionamento com o Marcos era marcado pela insegurança. Eu aceitei ser a outra, então que agüentasse e naquele domingo eu tava sem ele. Brenda me pegou num momento de fraqueza. Eu tava mesmo grogue de sono, mas triste também. Na frente dos outros não podia expressar o que sentia, isso era horrível. Embora tivéssemos estado mais juntos por causa dos eventos, desfiles em clubes, boates, diante dos outros tínhamos que ter descrição. Eu mudei muito, mas pra pior. Meu jeito de falar ficou até mais malicioso. Que coisa mais louca eu vivia! Tudo escondido. Só expressava meus sentimentos entre quatro paredes. Depois daquele período de carnaval, recomecei a faculdade. Na primeira semana ainda era verão, mas havia chovido muito nos últimos dias e tava até um pouco frio. Minha rotina voltou a ser a mesma e como estive mais tempo com o Marcos, sentia muita falta dele. Ele começou a aparecer bem menos, às vezes tinha eventos, no primeiro sábado após meu reinício da faculdade teve um e eu fui com ele. Ele tava mais tenso, trabalhando mais e senti que havia algum problema, mas ele não deixava claro o que. Naquele período em que ficamos nos vendo muito e que durou até o fim do carnaval, tivemos algumas brigas, uma até bem feia, mas já tinha passado. Os dias foram passando e nem durante a semana ele aparecia. Um dia eu tava trabalhando normalmente e senti uma tonteira. Quando dei conta, tava deitada no sofá, seu Arnaldo me dando um copo d’água e o filho dele com um pano com vinagre pra eu cheirar.
- Que foi? Que aconteceu? – eu perguntei
- Cê desmaiou, minha filha. – seu Arnaldo respondeu
- Eu... – tentei levantar, mas ainda tava tonta.
- Tá tudo bem com você? – ele perguntou – Se precisar, eu dou dispensa hoje.
- Não que é isso, não é nada demais.
Continuei trabalhando sem pensar muito no que aconteceu. Naquele dia mesmo, uma dona muito irritada apareceu perguntando pelo seu Arnaldo fazendo o maior auê na academia, na rua e todos os que estavam perto olhavam. Uma moça que era uma das mais antigas clientes, deu o serviço.
- Essa aí tem um filho com o Arnaldo.
- É? Foi casada com ele? – perguntei
- Que nada! O filho dela com ele é mais novo do que os filhos dele com a esposa! Eu gosto do Arnaldo, mas se eu fosse mulher dele, sabendo que ele tem um filho com outra e ainda por cima mais novo do que os meus com ele, não continuaria casada com ele!
Eu fiquei paralisada. Me senti no lugar daquela mulher que achei tão vulgar e me senti horrível. Naquela noite não passei bem e nem consegui ir à faculdade. O pouco que comi, vomitei tudo. No outro fim de semana, Marcos também não apareceu. Como seu Arnaldo tinha contato mais direto com ele, eu perguntei se tinha notícias dele e ele disse que Marcos tava com uns problemas. Liguei pra Alessandra e pedi pra ficar sábado e domingo na casa dela e nós conversamos.
- Fala amiga, cê tá tão abatida, o que houve?
- Pois é, Lessandra, eu pedi pra ficar aqui este fim de semana pra despistar meus pais.
- Algum problema com o Marcos?
- Acho que sim.
- Como assim, acha?
- Ele anda sumido e eu não tenho certeza, mas há poucos dias tive a maior tontura, tô ficando enjoada com qualquer coisa que engulo.
- Sua última regra veio?
- Veio, mas ainda não é uma confirmação.
- Mas se a regra veio, indica que você não tá grávida.
- Nem sempre. Não lembra que a sua mãe mesma já falou sobre a regra pós-gravídica? Ela teve e tava grávida de você.
- Ih, é mesmo. Ela falou que até errou nas contas até que fizesse exame e o médico explicou isso. É até em menor quantidade, mas a mulher não percebe.
- Pois é. Minha regra dificilmente atrasa, mas eu ando sempre tão nervosa que nem reparei se essa última veio em menor intensidade. Também, minha última TPM me deixou como um bicho.
- Cê tá mesmo muito tensa, Carla. Se descobrir que tá grávida, o que vai fazer?
- Vou ter a criança.
- Cê tem condições? E os seus pais?
- Danem-se eles! Ganhei mais dinheiro, tô juntando, eu me garanto.
- Calma, Carla. Não adianta ficar com raiva deles. Seu pai se souber vai ficar uma fera.
- Eles achavam o que? Que eu ia ficar pura pra toda vida? Já comecei tarde, com 18 anos. Lá em Paciência tem menina da minha idade que ainda é pura, mas eu pra quem foi criada em Ipa, até comecei muito tarde.
- Mas isso não é vantagem, Carla. Eu sou mais experiente e nem por isso me acertei com os homens. Você não sente amor pelo Marcos e sim paixão. Falo isso pra você pra te ajudar, pois vejo que tá sofrendo e sofro por ver você assim.
- Ai, Lessandra...- me joguei nos braços de Alessandra, chorei e ainda lamentei – tadinha da Brenda, me ligou outro dia com o maior carinho e eu nem soube aproveitar aquele apoio que ela queria me dar. Por que eu sou assim? Por que magôo a quem eu quero tanto bem? Não importa que ela tá naquela igreja, ela não deixou de ser minha amiga e nem eu deixei de gostar dela, eu amo a Brenda mais que como uma irmã.
- Ela não tá chateada com você. Com certeza. Se você procurá-la, ela vai te receber de braços abertos.
- Vai ficar pregando pra mim!
- Deixa, ué! Ela acha que assim tá te fazendo bem. Você não tem que ser da igreja por causa disso.
- Ai...sabe que eu acho que ela de nós três é a que ficou melhor?
- Pode até ser, mas eu não me sinto mal. Só acho que cê precisa de apoio e eu quero dar. Assim eu esqueço meus dramas existenciais. Seu problema é difícil, mas você vai conseguir botar a cabeça no lugar.
- Eu fico pensando. Sempre fui tão cuidadosa pra não engravidar. Se eu estiver grávida, quando foi que fiquei? Não tô conseguindo lembrar quando aconteceu este descuido.
- Bem. A mulher usa seus métodos, mas o homem também.
- Aí é que tá. Não consigo lembrar agora de alguma vez que eu tenha esquecido e ele também, por que nós dois sempre nos prevenimos.
- Às vezes, a gente bloqueia.
- É...

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

CAPÍTULO XXV

NOS ÁTRIOS – BRENDA
Estava previsto um retiro na igreja que eu visitava no período de carnaval. Convidei Alessandra e Carla, mas elas recusaram dizendo que já tinham compromissos. Como lamentei. Meus pais não concordaram muito a princípio, mas eu expressei tanta vontade de ir que eles acabaram cedendo. Eu curti o local. Foi num sítio em Teresópolis. O pessoal era muito animado. Como senti falta de Carla e Alessandra. Eu sabia que elas não estavam felizes. Na minha cabeça ansiosa, eu tinha certeza que seria bom pra elas, mas eu teria que ter primeiro a minha experiência. No retiro estive em maior contato com a palavra de Deus. Conversei muito mais com a dona Maria. Naquela primeira noite ouvi com atenção a palavra: "O temor do homem armará laços, mas o que confia no SENHOR será posto em alto retiro." (Provérbios 29 : 25). Comparei essa passagem à minha vida e às das minhas amigas. Achei que aquela palavra era pra mim e serviria pra elas também. O temor do homem pra mim era o que a Carla tava passando. Não sabia detalhes sobre sua vida, pois ela tava se afastando um pouco de mim, embora eu sentisse que ainda tinha a semente da nossa amizade viva no seu coração. Ela tava perdida. Queria tudo, mas eu previa que pudesse acabar sem nada. Ela continuava de caso com o Marcos, presa a ele. Ela temia ao homem, não ao SENHOR. Colocava expectativas no que o homem poderia lhe dar. Este temor do Senhor eu via como respeito a Ele. A Alessandra não confiava no SENHOR, mas não conseguia confiar no homem. Todos os que passavam pelo caminho dela a decepcionavam. Fiquei tão impactada aqueles dias que através das conversas com as pessoas cheguei à uma conclusão: o que será que tô esperando pra ser membro desta igreja? Já vi gente indo à frente e declarando que Jesus é seu único e suficiente salvador, o que tô esperando pra fazer isso? Assim o fiz. Se o ano de 1986 foi um ano de mudanças e uma introdução do evangelho para mim, 1987 foi o ano em que eu nasci de novo. Cheguei do retiro e disse que aceitei Jesus, que agora era crente. Meus pais se assustaram, acharam esquisito, pois viam Deus pela religião, mas eu a partir daquele momento entendi que O Espírito Santo é que convence a gente de que Jesus é o único e suficiente salvador. E através deste mesmo Espírito Santo eu passei a entender mais a Bíblia. Nessa minha caminhada inicial sempre encontrava passagens que me marcavam mais e respondiam às minhas necessidades de nova convertida, como: Crê no Senhor Jesus Cristo e serás salvo, tu e a tua casa. (Atos 16 : 31-b); eu e a minha casa serviremos ao SENHOR. (Josué 24 : 15-b) pois a peleja não é vossa, mas de Deus. (II Crônicas 20 : 15-b). Era meu maná pra que eu perseverasse na fé e orasse pra todos os meus queridos, inclusive Alessandra e Carla, que mesmo longe, estavam perto do meu coração. Eu orava muito de madrugada, tinha o maior gás, ia lembrando de parentes de situações que via acontecer na rua, pedia pelo bairro pelas pessoas da vizinhança e assim, já começaria em pouco tempo a faculdade e o curso de magistério com uma nova mente, a mente de Cristo. Naquela época, pouco ainda se falava no evangelho comparado a hoje, mas já tinham alguns horários nas TVs, em algumas rádios. Além disso eu ia regularmente à igreja, até começarem as aulas, em dias de semana.
Continuava orando, intercedendo muito por Alessandra e Carla e aproveitava pra ligar pra elas, embora fosse difícil encontrá-las em casa. Num domingo de manhã, voltando da igreja ocorreu ligar pra Carla do orelhão:
- Alô... – Carla atendeu com uma voz cansada, triste
- Carlinha?
- Oi, Brenda.
- Cê tá bem?
- Tô, é que eu tô um pouco cansada, tenho participado de uns eventos com as agências e lojas que patrocinam a academia. Essa noite estive num que varou a madrugada, dormi pouco.
- Eu tô te incomodando, né, querida? Cê queria dormir.
- Não fofinha, pode falar.
- Cê tá sozinha em casa? O telefone tocou tanto.
- É, tô, meus pais saíram.
A voz de Carla realmente expressava cansaço, mas eu reparava umas pausas, ela fungava, mas acho que não era resfriado, pra mim ela tinha chorado.
- Cê tá bem mesmo Carlinha?
- Tô sim. É como eu disse, tô muito cansada.
- Carlinha, eu tô sentindo sua vozinha triste. Fala comigo o que foi lindinha, cê tá escondendo alguma coisa. Cê já confiou mais em mim.
- Não é nada não...
- Carlinha, eu quero que cê saiba que mesmo que esteja fazendo alguma coisa que seja errada, eu jamais darei às costas a você. Meu amor por você permanece.
Foi aí que lembrei de uma expressão que ouvi num culto: “o amor constrange”. E constrangeu. Assim que acabei de falar pra Carla que meu amor por ela permanecia, ela desabou no choro, não conseguiu mais esconder sua tristeza.
- Brenda, eu...não tô muito bem, eu tô mesmo cansada...mas também de muita coisa na minha vida...não posso falar, você não vai entender.
- Por que cê acha que eu não vou entender?
- A gente pensa muito diferente, mas eu também te amo, Brenda. Mesmo sendo toda certinha e eu sendo o que sou, que nem mais sei o que sou, quem sou, o que quero, o que vou fazer da minha vida! Deixa pra lá! Eu tô cansada mesmo e nem sei mais o que tô falando! Preciso descansar, Brenda, desculpa! Não leva a mal, quando eu conseguir eu falo com você.
- Não fica assim. Quero tanto te ajudar.
- Mas não dá! Eu que tivesse feito tudo diferente!
- Mas tem solução.
- Não, não tem!
- Tem sim: Jesus.
- Ah, Brenda, dá um tempo, tá?! Depois a gente se fala! Agora eu não tô bem e vou acabar sendo grossa com você. Desculpa, tá? Tchau!
- Tchau. – eu respondi e acho que ela nem ouviu, desligou antes.
Pensei em ligar pra Alessandra pra saber o que tava havendo com Carla, mas talvez ela não soubesse e se soubesse, talvez não contasse. Eu sabia que era por causa do tal Marcos, mas eu não ia repetir o que achava e ela não ia me ouvir. Resolvi não ficar em ansiedade. Orei, pedi muito por Carla e também lembrei de orar por Alessandra. Coloquei em prática a palavra: "Entrega o teu caminho ao SENHOR; confia nele, e ele o fará." (Salmos 37 : 5)

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

CAPÍTULO XXIV

DA CALMARIA DE BÚZIOS À AGITAÇÃO DE IPA – ALESSANDRA
Depois daquele episódio com Beto, segui a sugestão de minha mãe e no fim de semana seguinte fui pra Búzios. Meu pai tava lá me esperando. Abraçamo-nos muito, beijei muito o rosto do meu amado pai, pois sentia muita falta dele. Contei sobre o Beto, ele também lamentou e também achou que foi melhor do que descobrir mais tarde, quando estivesse mais envolvida.
Eu disse que estive com ele e que não guardei mágoas, que queria que ele se recuperasse. Tinha pouco tempo pra aproveitar aquele sol de Búzios, teria que voltar no domingo pra 2ª feira pegar no batente. Enquanto meu pai descansava fui à praia pertinho da casa curtir o mar, apreciar a paisagem. De repente, fui surpreendida por um flash e me virei
- Oi. – falei instintivamente
- Oi, desculpe se te assustei, mas te achei tão linda que dei um click. – um rapaz louro alto aparentando ser um pouquinho mais velho que eu se apresentou assim a mim.
- ‘Brigada...
- Meu nome é Renato. Cê mora por aqui?
- Não. Quem tem casa aqui é meu tio, irmão do meu pai, mas ele quase não vem e empresta a casa pra ele. Tô lá com meu pai. A casa é aquela branca logo ali em frente.
- Ah, tá. Eu também tô de passagem. Tô tirando umas fotos daqui. Você não se incomodou por eu tirar a sua, né?
- Não, tudo bem. Aliás, minha mãe também é fotógrafa. Você tão novo já é fotógrafo profissional?
- Tô montando um estúdio. Cê mora no Rio?
- Sim. Moro em Ipa. Já fiz fotos pra propaganda, trabalho numa academia e tô cursando educação física.
- Eu moro no Leblon. Sou mais da arte.
- Engraçado, né? Morando até perto e se conhecendo por aqui, onde eu quase não venho.
- O destino nos reserva surpresas. Boas surpresas.
E aí, conversa vai, conversa vem, descobrimos nossos pontos em comum e eu o convidei a conhecer a casa. Quando entrei tava a maior fumaça vindo do terraço, meu pai tava fazendo churrasco. Apresentei o Renato ao meu pai, ele ficou mais um pouco pro churrasco e depois combinamos de nos encontrarmos no Rio. Ele ainda ia ficar mais uns dias em Búzios.
Voltei bem mais animada pro Rio. Minha mãe reparou logo e perguntou:
- Encontrou algum surfista em Búzios?
- Não, um fotógrafo.
- É?
Ela ficou curiosa e contei tudo.
- Você não perde tempo, hein?
- Ah, mãe, acabei de conhecer.
- Mas pelo jeito conheceu e já se interessou.
- Parece que ele também por mim.
- Claro, né? Mal te viu já deu um click.
- É.
Ainda naquela semana recebi um envelope cujo remetente era o Renato. Abri e vi minha foto. Saiu muito boa. No verso, tava escrito: “Para a musa de Ipa, que também é de Búzios. Parabéns pela sua beleza que transforma qualquer paisagem simples em maravilhosa”
- Ganhou um fã hein? – minha mãe comentou.
Pouco tempo depois estive com o Renato, nos conhecemos mais, saímos, fomos á reuniões de amigos dele e descobrimos cada vez mais coisas em comum, até que em pouquíssimo tempo já estávamos namorando. Mas era engraçado, eu não conseguia ficar muito tempo sozinha, mas também não sentia que já havia encontrado o amor da minha vida. Até quando seria assim?
No mês de fevereiro o tão esperado concurso de RAINHA VERÃO 87. Ganhei, apesar de muitos pensarem que foi coisa arranjada por minha mãe ser fotógrafa e bem relacionada, mas não foi assim. Os critérios eram muito rigorosos. Comecei a perceber ciúme do Renato, mas achava bom, pois no meu entender isso esquentava a relação. Meu ego tava inflado por causa da popularidade que passei a ter depois do concurso. Eu era muito procurada pra fazer matérias pra revistas e sei que despertava a atenção dos homens em todos os lugares que passava. Renato demonstrava uma irritação nas festas que ia comigo e numa delas, um cara de porre chegou perto de mim e foi muito inconveniente.
- RAINHA VERÃO 87.
- Quer deixar minha namorada em paz, cara! – Renato advertiu o cara.
- Calma, amor. – eu tentei apaziguar.
- Calma?! Já tô cheio disso! – Renato empurrou o cara que caiu em cima de outro também já alto e aí foi uma tremenda pancadaria que acabou na delegacia.
Eu fiquei arrasada. Me perguntava: “Quando será que vou ter sorte com um homem?” Eu pensava se não era um erro meu, me envolver muito rápido pra logo me decepcionar. Mas também, como conciliar uma carreira de modelo que começava a crescer com um namoro sério? Lembrava da Carla que estava passando por uma situação bem pior, pois era “a outra”. Eu queria conseguir gostar verdadeiramente de alguém, mas não acontecia e eu não renunciava a nada que quisesse fazer por ninguém. Já a Carla, tava renunciando a uma vida com mais liberdade, poderia estar melhor se não aceitasse as ofertas que lhe deram. Brenda é que tava certa. Mas a gente na época não enxergava isso. Quando eu e Carla nos encontrávamos ou falávamos pelo telefone, ela contava como tava indo seu caso com o Marcos. Quando estava com ele mais perto e era sábado, ficava lá em casa até domingo, pra despistar os pais. Eu contei sobre o fim do namoro com Renato. Ela lamentou que eu ainda não tivesse encontrado o homem ideal, mas achou melhor por ele ser muito ciumento. A gente se sentia mais liberada pra falar sobre homens longe da Brenda, a certinha. Eu era mais experiente e ouvia a Carla, aconselhava, mas não queria estar na pele dela. Seus pais não imaginavam que ela tinha um caso com um homem casado, mas e se soubessem? Eu ficava muito preocupada com ela. Carla teve acesso a informações que seus pais não tiveram, ela via o mundo de outra forma, isso criou uma distância dela entre eles. Apesar de se esforçarem pra que ela tivesse estudo e bolsa integral, eles erraram não acompanhando o ritmo de vida da filha. Ficaram pra trás e pensaram que a orientaram bem.
Brenda ia bem, ainda na loja e em breve ia cursar a faculdade e outro curso. Mas o que começou a nos afastar foi o tempo muito ocupado e a igreja. Ela falava muito da Bíblia e a gente achava aquilo um saco. Ainda não era membro, mas alguns domingos deixou de sair com a gente por que ia à igreja. Apesar disso, sei que nossa relação de amizade ainda era muito forte, mas se naquela época a gente entendesse o que está neste versículo: Então o SENHOR disse a Satanás: Donde vens? E Satanás respondeu ao SENHOR, e disse: De rodear a terra, e passear por ela. (Jó 1 : 7) entenderíamos o que este adversário tava tentando fazer com nossa amizade, com nossas vidas. Pelo menos a Brenda pôde entender bem antes que eu e Carla.

terça-feira, 10 de novembro de 2009

CAPÍTULO XXIII

SOB O DOMÍNIO DO DESEJO – CARLA
No dia primeiro de janeiro, Alessandra levou-me para casa e a gente conversou mais abertamente durante o caminho sobre tudo o que aconteceu naquela virada do ano. Sentia-me mais livre para falar com ela do que com Brenda. É como se eu quisesse uma aprovação pro meu erro. Apesar disso, sabia que mesmo que ela me apoiasse a ter uma relação ilícita não deixaria nunca de me alertar. Ela podia até cometer erros, mas queria o meu bem, talvez mais do que o seu próprio. Brenda sempre foi a mais sensata e no momento que eu mais deveria ter recorrido à essa sua qualidade, foi o que mais me afastei dela. Como me arrependi, como sofri. Naquele tempo eu ainda acreditava que ano novo era sinônimo de vida nova. Hoje minha conotação é muito mais ampla. A cada dia a gente está se renovando. Eu era uma garota cheia de sonhos. Mas começava a ver que não poderia controlá-los. Foi tudo tão inesperado e rápido. Em parte eu me culpava, lembrava do que Brenda disse, sobre as conseqüências do meu ato. Pintou uma insegurança total. Eu pensei: “Agora que o Marcos conseguiu o que queria, vai me jogar pra escanteio”. Claro que eu não queria que ele fizesse isso, mas por outro lado, mesmo já tendo acontecido uma coisa mais íntima entre nós eu achava melhor não ir adiante. Ah, se fosse fácil controlar sentimentos tão desordenados de menina moça! Quanta ilusão, quanta insegurança! Eu já tava dominada totalmente pelos meus desejos e sabia que assim que ele aparecesse na minha frente eu cederia.
Na 6ª feira, dia 02 de janeiro, estava lá eu na academia. Seu Arnaldo chegou, deu bom dia, desejou-me um feliz 87 e disse:
- Carla, como você tá de férias na faculdade, tenho um trabalho alternativo que vai garantir mais um dinheiro bom neste período.
- Ah, é? Onde?
- É num escritório no Centro. Você lembra daquele pessoal que fez fotos suas pra propaganda da academia? É lá. Eu te levo.
- Eu posso ir sozinha seu Arnaldo, o senhor não tem obrigação nenhuma de me levar.
- Mas pra mim é um prazer e eu tenho que passar por lá mesmo. No fim do expediente te levo, meu filho vai fechar a academia hoje.
- Mas é o que, seu Arnaldo?
- Olha, eles querem aproveitar você pra mais propagandas e também eventos, desfiles. Lá eles explicam melhor.
Liguei pros meus pais e eles autorizaram, pois seu Arnaldo já tinha conquistado a confiança deles. Esperei dar a hora e seu Arnaldo me levou pro Centro. Sendo pra ganhar mais dinheiro, eu não pensei muito, pois alguém poderia pegar na minha frente e o que eu mais queria era ficar cada vez menos dependente dos meus pais. Eu tinha casa, comida, roupa lavada, mas quanto mais tempo estivesse ocupada, menos tempo ficaria em casa e teria boas justificativas pra não precisar ajudar minha mãe nas encomendas dela, me faria respeitar mais. Eu queria mesmo era abraçar o mundo com as pernas. O mundo...o enganoso mundo. Eu estava ansiosa. Chegamos ao escritório. Seu Arnaldo subiu lá comigo e me apresentou ao pessoal. Alguns eu já conhecia antes quando fiz as primeiras fotos pra propaganda. Eles mostraram outras fotos que eu ainda não tinha visto. Fiquei fascinada com a possibilidade de em pouco tempo juntar mais dinheiro.
- Eu tô voltando daqui pra Paciência, mas não se preocupe que você vai ter carona pra casa. – seu Arnaldo avisou
- Tá seu Arnaldo, ‘brigada. – agradeci sem jeito, pois pensei que ele me traria de volta.
Continuei conversando com um dos sócios da empresa de propaganda, Edson, que produzia anúncios da academia do seu Arnaldo e ele disse que eu participaria de desfiles de roupas esportivas, apresentados durante eventos em casas noturnas do Centro e de clubes também no Centro e em Campo Grande, Santa Cruz. Fiquei deslumbrada. Pensei: “Será que eu dou conta”? Edson disse que eu teria alguém responsável pela minha agenda, um cara que tinha uma micro-empresa que fazia serviços em parceria com outras e inclusive a dele e que eu seria free-lance, pois essa pessoa já me conhecia e que outra empresa que patrocinou propagandas minhas pra academia em parceria com a dele tinha ficha minha. Ele acabou de falar isso e apareceu o Marcos. Fiquei muda, mas tentei me recompor. Como a ganância falou mais alto, não ia voltar atrás. Marcos havia arranjado um meio muito eficiente de me prender mais a ele. Cumprimentou-me sorridente conseguindo até certo ponto disfarçar sua euforia em me ver lá. Explicou mais alguns detalhes e procurei me controlar ao máximo na presença dos outros. Depois, aceitei um convite dele pra ir a um bar lá perto. Na ida pra lá, quase não falei nada, mas quando sentamos e ele pediu bebidas, finalmente olhei fixo pros olhos dele e disse:
- Parabéns.
- Ué?! Parabéns por quê?!
- Por que você conseguiu o que queria.
- Como assim?!
- Marcos, deixa de ser cínico! É impressionante como você tem truques! Nós nos conhecemos há tão pouco tempo, mas parece que você já me conhece bem melhor do que eu a mim mesma! Você sabia que uma coisa assim ia encher os meus olhos, que eu não ia recusar e apareceu quando já tava tudo acertado e com a certeza de que eu não ia voltar atrás! Desde o começo, quando seu Arnaldo me falou que eu ia ser garota propaganda, já tinha dedo seu! Eu quero ficar independente dos meus pais e você abriu o caminho pra isso. Tô achando estranho você ainda não ter cobrado, pois quando a esmola é muito grande, o santo desconfia.
- Tá, eu fiz de caso pensado, confesso.
- Pelo menos isso! Mas o que faz você pensar que eu acredite que vai ficar só nisso? Você vai bancar o empresário pra mim e não vai querer nada em troca além do que já conseguiu no réveillon? Me engana que eu gosto!
- Carla, se você não gostasse de mim, eu ia acabar tirando o meu time de campo. Mas depois do que houve entre a gente eu sei o que represento pra você.
- Você é muito convencido!
- Convencido ou consciente?
- Que?! Como assim?!
- Posso ter forçado a barra no réveillon, mas você também quis.
- Tá, Marcos, eu também quis, mas agora não tô querendo mais.
- Carla, não vamos mais discutir sobre o que é óbvio. A gente se gosta, se deseja. Pra que resistir?
- Pra não sofrer mais do que já sofri. Ou você quer que eu acredite que vai largar sua mulher pra ficar comigo?
Marcos abaixou a cabeça e eu falei:
- Tá vendo? Toquei direto na ferida. Cê quer ter uma vida dupla! Cês homens são todos iguais!
- Eu não nego que estou sendo covarde em não assumir publicamente uma relação com você, mas não negue que me quer.
- Ai, Marcos...como você é insistente!
- Carla, se você soubesse como é difícil o meu casamento e que tenho razões pra não deixar minha mulher.
- Para de se fazer de vítima, Marcos, cê quer me ter como uma válvula de escape. Isso é chantagem emocional. Agora vai me convencer que sua mulher é uma desequilibrada, uma louca, por isso que não larga dela?
- Eu sei que é difícil entender, não vou tentar te convencer de nada, mas só eu sei o que passo.
- O que não justifica o seu erro. Aliás o nosso erro, era só seu até que eu cedesse.
- Tá, até aceito, mas nunca senti por ninguém o que sinto por você.
Eu comecei a chorar. Meu sentimento pelo Marcos cresceu muito desde aquele episódio na entrada do ano e eu não tinha como negar. Eu queria e não queria. Marcos acariciou meu rosto. Depois chegou mais perto e carícias mais intensas prosseguiram noutro lugar onde ficamos a sós.
Entrei numa armadilha da qual não podia nem queria mais sair. O que fazer? Simplesmente o que não fiz: ter recusado a oferta da empresa e assim sair da boca do lobo. Mas fiquei aprisionada pelo desejo de crescer financeiramente, ver fotos minhas em propagandas, ser admirada e me entregar definitivamente ao Marcos. Definitivamente modo de dizer, pois quem aceita condições como as que eu aceitei, sabe que entra num jogo pra perder, pra ficar de reserva, nunca ser a titular, a substituta, nunca a matriz, só uma pequena filial, além de viver na expectativa de um dia poder ser jogada pra escanteio. Fiquei dividida, mas o desejo falou mais alto. E pensar que poucos meses antes eu não queria de jeito nenhum, chorava não querendo ferir meus princípios, procurando obedecer o que aprendi sobre integridade, moral. Tudo descendo abaixo num mar de lama, só por querer ascenção, independência. Que independência? Estava totalmente dependente do que sentia pelo Marcos. Aos meus 18 anos queria me livrar da vigilância dos meus pais da pior maneira. Comecei a driblar os dois. Durante os eventos em Campo Grande ou Santa Cruz, aproveitava os intervalos e tinha meus rápidos encontros íntimos com Marcos. Como os eventos acabavam tarde eu dormia em casas de amigas que participavam e moravam perto. Outras vezes, quando estava no Centro, aos sábados, ia depois pra casa da Alessandra e depois voltava pro Centro pra outros eventos domingo à tarde e ficava com ele outra vez e conforme fosse seu tempo, Marcos ficava comigo em Ipanema e lá mesmo havia um lugar próximo no qual ficávamos a sós. Quando eu ficava na casa da Alessandra, meus pais ficavam muito mais tranqüilos, pois nem imaginavam minhas travessuras, mas também não desconfiavam de nada quando era na casa de outras meninas, pois elas chegavam em casa comigo. Eu tinha um “álibi” perfeito. As horas que eu passava com o Marcos eram como um sonho acordada, Como eu ficava nas nuvens quando estava com ele...ele era tão carinhoso, me chamava de minha menina. Quando a gente se despedia, o sonho virava pesadelo e eu me confrontava com a triste realidade de esperar dias pra tê-lo ao meu lado outra vez. De que adiantava querer ser independente dos meus pais, se eu era inteiramente dependente por outro lado das migalhas que Marcos me oferecia? Lembrei exatamente do que Brenda alertou usando essa expressão. Que preço eu paguei. Eu era jovem demais pra entender, mas, quando um dia li a passagem: “Alegra-te, jovem, na tua mocidade, e recreie-se o teu coração nos dias da tua mocidade, e anda pelos caminhos do teu coração, e pela vista dos teus olhos; sabe, porém, que por todas estas coisas te trará Deus a juízo” (Eclesiastes 11 : 9) entendi o que fiz com a minha vida e também comparei este mesmo período com outra passagem: “Todas as coisas me são lícitas, mas nem todas as coisas convêm. Todas as coisas me são lícitas, mas eu não me deixarei dominar por nenhuma” (I Coríntios 6 : 12) e infelizmente eu estava me deixando dominar.

sábado, 7 de novembro de 2009

CAPÍTULO XXII

REVELAÇÕES – ALESSANDRA
Minha mãe chegou pouco depois que Brenda saiu. Eu já tinha tomado um banho e estava pronta pra me deitar. Abraçamo-nos desejando uma à outra um feliz 87. Carla dormia profundamente. Contei sobre o Beto, minha mãe lamentou, mas disse que há males que vem pra bem e isso seria um aviso pra começar o ano com o pé direito. “Bola pra frente, que aí vem gente!” Ela dizia. Era bom vê-la assim animada. Não guardava mais ressentimentos de meu pai e eles até conversavam amistosamente. Deu a volta por cima e estava ganhando dinheiro como fotógrafa free-lance. Na festa de réveillon ganhou em horas o que em outras ocasiões ganharia em meses. Estava progredindo e eu estava orgulhosa dela. Fomos deitar e deixamos o telefone na secretária eletrônica, abaixando a campainha. Antes deixei um recado na secretária de meu pai desejando-lhe feliz ano novo e avisando que não se preocupasse se ligasse e ninguém atendesse, pois estaríamos dormindo. Dormimos bastante e eu acordei por volta das 16:00. Chamei Carla que tava ainda grogue de sono e levei-a pra casa às 17:30. Fiquei na casa da Carla um pouco, conversando, matando as saudades dos seus pais e saí de lá por volta das 21:00. Telefonei da rua pro meu pai e como o encontrei em casa fui lá vê-lo. Cheguei pouco mais de meia noite em casa e minha mãe não tava. De tão cansada nem pensei em ouvir os recados na secretária eletrônica. Ainda chateada com o episódio do Beto no réveillon, fui trabalhar no dia seguinte pensando que poderia me aborrecer se ele aparecesse lá. Ele não apareceu e achei que foi por vergonha. Ouvi os recados na secretária eletrônica e não tinha nenhum muito importante e também nenhum dele. Chegou o sábado e eu não tive notícias dele, mas também não me esforcei pra saber, pois ele é que havia vacilado comigo, então ele que me procurasse.
No domingo fui à praia e quando voltei o dia ainda estava claro. Minha mãe saiu e eu esquentei uma comida. Depois ouvi os recados da secretária eletrônica e entre eles um me chamou muito a atenção: “Alessandra, sou eu, Alex, amigo do Beto, que saí com você e uma amiga sua, lembra? Por favor, me liga assim que puder”. No fim da mensagem ele deixava seu número de telefone e horário em que eu o encontraria em casa. Como liguei e ninguém atendeu, também deixei um recado na secretária eletrônica da casa dele e aguardei resposta. O telefone tocou um pouco depois quando eu tava terminando de tomar banho. Corri enrolada na toalha pra atender. Começou a gravação, mas eu peguei logo o telefone.
- Alô?
- Alessandra?
- Sim, é ela!
- É o Alex.
- Cara, o que houve? Aconteceu alguma coisa com o Beto? Eu não o vejo desde o réveillon.
- Pois é. Ele ficou sumido e só agora eu soube dele. Liguei pra irmã dele e ela disse que ele foi levado pro Miguel Couto, depois transferido pra outro hospital.
- Ele tá muito mal?
- Teve uma overdose.
- Meu Deus! Dá o endereço de onde ele tá, vou pra lá agora.
Corri pro hospital e soube que o Beto não corria risco de vida, mas o susto foi grande. A irmã dele tava lá, de plantão. Os pais ainda não sabiam, pois estavam fora. Acharam melhor esperar o perigo passar pra depois falar com eles. Meu sentimento passou da mágoa à compaixão depois que falei com a irmã dele, a Andréia.
- Pôxa, Andréia, que susto, hein?
- É. Obrigada por ter vindo.
- Cumé que foi isso? Ele já tava estranho no réveillon, soube que a partir daí ele sumiu.
- Pois é Alessandra. Ele teve uma recaída.
- Recaída?! Não tô entendendo. Ele bebia socialmente, não fazia cenas como a que eu vi.
- Pois é, mas, sabe aquele pessoal do vira virou? Gente que não tem mais o que fazer e aparece no caminho só pra ajudar a afundar os outros?
- Sei...
- Pois é. Meu irmão nunca se assumiu um alcoólatra nem um usuário de drogas, mas eventualmente agia como um. Ele até já bebeu com limites, mas com aquele pessoal em outros tempos extrapolou e justamente no réveillon reencontrou o grupo que ainda por cima tem gente que puxa erva, cheira e ele perdeu completamente a noção das coisas.
- Eu bem que senti cheiro de maconha na praia naquele dia, mas como não vi ninguém fumando e tinha muita gente, nem deu pra perceber se vinha de alguém que tava com ele.
- Eu não acho bom terminar o ano na praia. Sempre soube de coisas assim que acabaram mal. Ainda mais quando você não tá em família, com pessoas que gostam de bagunça. Pena que meus pais foram pra fora, se não ele passaria com eles, comigo. Eu me sinto responsável pelo meu irmão. Tinha 6 anos quando ele nasceu.
- Ele tá acordado?
- Não. Mas tá bem. Ficou um pouco agitado, mas depois deram calmante pra ele.
- Ele precisa seguir um tratamento, né?
- É, mas vai depender dele.
- Fala pra ele que não tô com raiva dele.
- Você volta aqui depois?
- Volto, mas como amiga. Não tô com estrutura pra continuar namorando um cara com esses problemas. Acho que posso fazer mais por ele oferecendo minha amizade. Não fica chateada comigo, mas é melhor assim.
- Tá, eu entendo. Acho que faria a mesma coisa no seu lugar. Agradeço muito Alessandra. Outra no seu lugar talvez não tivesse uma posição humana como a sua. Não vou esquecer seu gesto, querida.
Saí arrasada do hospital. Beto vacilou, mas era um cara legal. O que são as más companhias, como o ser humano é fraco! Eu pensei. Quando cheguei em casa conversei com minha mãe e ela me consolou.
- Dá um tempo em relacionamentos, minha filha, pensa um pouco no que você tá fazendo, na sua faculdade.
- Acho que eu vou dar um tempo mesmo, mãe. Se aparecer alguém legal, apareceu, mas vou mudar um pouco de ares. Tô pensando em ir mais pra Búzios nos fins de semana, meu pai disse que meu tio nem tem usado a casa e ele tem ido, me convidou pra ir.
- Então, filha, aproveita, vai e relaxa lá, coloca a cabeça no lugar.
Minha reação ao ocorrido foi uma resposta: eu não amava o Beto. Apesar de ter tentado investir numa relação melhor do que a que eu tinha com o Allan, não o amava. Com o Allan eu tinha até mais certeza de que não queria nada sério, mas foi meu orgulho que ficou ferido quando ele me trocou por outra. O Beto inicialmente foi uma válvula de escape, mas depois pensei que poderia aprender a gostar dele e como conseqüência depois vir a amá-lo. Eu quis cair fora, não tava disposta a enfrentar aquele problema. Pode ter parecido egoísmo da minha parte, mas pelo menos não fui insensível. Entendi que ele precisava de ajuda. Alguns dias depois fui visitá-lo e confirmei que não queria ser mais namorada dele, mas que ele teria em mim uma amiga fiel. Foi melhor assim. Analisando hoje vejo que minha atitude foi certa. Eu não era madura o suficiente para enfrentar uma situação daquelas. Amadurecimento e sofrimento andam lado a lado e eu tive que sofrer muito pra chegar até onde cheguei. Restou um saldo positivo, pois descobri como pode ser diferente e compensador amar um ser humano sem cobranças, com compreensão. Foi uma revelação pra mim, um crescimento. Crescer dói. Doeu, mas a ferida foi tratada, a dor passou. Como muitas outras feridas que com o tempo eu aprenderia a curar. Um amor muito grande tomou conta de mim e o que houve com o Beto foi uma introdução ao ensinamento que eu entenderia mais tarde: Porque toda a lei se cumpre numa só palavra, nesta: Amarás ao teu próximo como a ti mesmo. (Gálatas 5 : 14)

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

CAPÍTULO XXI

SEMENTES DE ANO NOVO – BRENDA
Depois daquele tumultuado início de ano, apesar de lamentar o ato inconseqüente de Carla, pelo menos tivemos um saldo positivo: estávamos mais unidas na dor, tanto quanto na alegria. A dor de Carla era a nossa dor. Mais uma decepção para Alessandra pesava tanto para mim quanto para Carla. Mesmo não querendo me meter na vida de Carla, sei que teve uma importância o que falei e Alessandra também se preocupava com ela. União é isso. Quando a gente ama alguém, a felicidade pra gente é ver o outro feliz. É ver que se a pessoa com quem gostamos de compartilhar não quer mais uma comida servida na mesma mesa, ela fica sem gosto se essa pessoa não come com a gente. Os momentos são vividos em união e a pessoa querida tem que viver com a gente. É uma necessidade. Mas quando a gente vê que o amigo tá caindo num abismo e quer salvá-lo, a gente sofre se sente que ele não tá vendo este abismo. A gente avisa: “Você vai cair daí e ele não ouve a gente”. É triste, mas tem pessoas que levam tempo pra entender a situação em que estão.
Saí da casa de Alessandra ainda cedo, pois queria estar com meus pais. Despedi-me de Carla dando-lhe um beijo no rosto e fazendo um carinho nos cabelos dela enquanto dormia. Ela murmurou algumas palavras dormindo e eu nem entendi. Despedi-me de Alessandra, prometendo depois ligar do orelhão pra ter notícias. No caminho para casa dentro do ônibus, minha cabeça tava a mil. Carregava uma tonelada da Alessandra e outra da Carla e consequentemente o meu ano também começava mal. Sentia-me impotente com um desejo de ajudar minhas amigas, sofrendo por elas. Eu ainda não podia dizer que sabia bem o que era o amor naqueles meus tenros 18 anos, mas elas, menos ainda. O amor que eu sentia e que tomava cada vez mais conta de mim era o amor pelas vidas delas. Sempre sonhei com o dia que cada uma ia ver a outra casando, tendo filhos, mas as circunstâncias pareciam mostrar tudo ao contrário do que eu sonhei. Eu pensava: “Será que sou mesmo uma sonhadora?” “Sou uma pessoa fora da realidade?” Mesmo assim, continuava desejando a felicidade das minhas amigas.
Cheguei em casa e procurei ficar numa boa com os meus pais, sem sinalizar o que aconteceu. Almoçamos juntos, conversamos e felizmente não expressei minha preocupação. Somente o que disse é que estava muito tumultuado na praia e não demoramos muito lá, voltando logo pro apartamento de Alessandra. Nem lembraram de perguntar sobre o Beto.
No primeiro domingo do mês e portanto daquele ano que se iniciava, fui à igreja com dona Maria. Era dia de santa ceia. Eu não participei, pois não era da igreja, mas a passagem bíblica que foi lida bateu fundo dentro de mim: “Examine-se, pois, o homem a si mesmo, e assim coma deste pão e beba deste cálice.” (I Coríntios 11 : 28). Pensei muito sobre isso, examinei-me mesmo não participando da ceia e pensei nos problemas de Alessandra e de Carla, se estava sendo uma boa amiga, pois via que faltava um discernimento maior a elas. O ano começava e a semente que já havia brotado em mim crescia. Eu sentia que naquele ano, muita coisa ia mudar, eu ia destrancar a faculdade, pensava em fazer o magistério de 1ª à 4ª série. Mas sabia que não era só isso. Uma mudança espiritual tava se desenvolvendo em mim e eu desejava que Alessandra e Carla vivessem aquela mudança também. Mas cada um tem a sua experiência no seu momento.

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

CAPÍTULO XX

LOUCURAS DE INÍCIO DE ANO – CARLA
Cheguei ao prédio de Alessandra contando com que àquela altura as duas já tivessem telefonado pra polícia, necrotério, hospitais e qualquer outra coisa que pudesse ocorrer. Minha roupa branca estava manchada, o laço de fita revirado ao redor da cabeça e me sentia cansada e anestesiada. Eu não acreditava no que havia acontecido. Nunca pensei que pudesse ser assim. Nem sei se era mais difícil acreditar no que fiz ou contar às minhas amigas. Pela primeira vez na minha vida me senti tão estranha, com tantas sensações emaranhadas. Pensava em tudo enquanto ia subindo no elevador. Toquei a campainha preparada pra levar uma bronca. Brenda abriu a porta e começou o sermão:
- Bonito hein, dona Carla! Nós aqui apavoradas enquanto a senhora devia estar com um mascarado!
- Cumé que cês sabem?! – fiquei estarrecida, pois quando aconteceu não pensei que elas tivessem visto.
- Nós perguntamos a um daqueles amigos malucos do Beto e ele disse que viu um mascarado te agarrando, levando você de lá.
- Ai, gente... – sentei e comecei a chorar. Além da angústia também senti um alívio, pois alguém já havia me poupado da primeira parte da história.
- Carla, que foi que aconteceu? Quem era o mascarado? – Brenda perguntou séria
- Eu vi aquele cara duas vezes lá em baixo perto do prédio. – Alessandra falou
- Você viu. Será que preciso dizer quem era ou você ainda não deduziu? – perguntei esperando que ela dissesse quem era.
- Não...não me diga que era o...- Alessandra ficou quase sem fala
- Você já respondeu. – olhei pra ela bem séria
- Mas Carla, como pode? – Alessandra ficou abismada com a persistência do Marcos.
- Ele conseguiu saber o seu endereço usando uma terceira pessoa pra passar pra ele.
- Não foi o seu patrão, né? – Brenda indagou
- Não, foi outra pessoa. Na hora nem me ocorreu, mas agora já imagino quem possa ter sido. Acho que foi uma garota que perguntou onde eu ia passar o ano novo, numa conversa assim como quem não quer nada. Lembro que eu comentei e ainda disse perto de onde ficava seu prédio. Daí com essa dica, foi fácil pra ele descobrir. Ele conhece bem a zona sul.
- Carla, que armadilha! – Brenda exclamou
- Podes crer, foi mesmo e eu caí direitinho, muito mais do que eu pensava.
- Mas como foi? – Alessandra perguntou
A cena veio toda à minha lembrança apesar de que eu estava já um pouco alta pela bebida. Contei tudo:
- Eu tava naquela multidão de amigos do Beto, um cara tava dando em cima de mim, mas saí de perto. Foi aí que ele apareceu com aquela máscara e me pegou à força achando que ninguém tava vendo. Eu fiquei assustada, ele me pegava com força e eu acabei indo quase carregada. Ele me levava e fazia um sinal com o dedo pra eu fazer silêncio. Eu gritava:
- Me solta, socorro!
Ele continuava a pedir silêncio sem falar, até me tapou a boca. Quando viu que estávamos longe, tirou a máscara
- Marcos?! – eu gritei de susto – Como você veio parar aqui?! Como soube que ia me encontrar?!
- Não importa. O que importa é que te encontrei e agora e não vou deixar entrar este ano sem ficarmos juntos.
- Você é louco, Marcos! Onde estão seus filhos? Sua mulher?
- Deixei meus filhos na casa de um amigo aqui perto. Minha mulher ficou em casa com a mãe, não tava se sentindo bem e insistiu que eu levasse as crianças pra ver o fim do ano em Copacabana, mas pediu que não entrasse com elas na praia. Ficaram cansados e eu os levei de volta pra casa deste amigo e disse que ia encontrar um pessoal aqui na praia. Felizmente encontrei quem queria.
- Marcos, você não podia se aproveitar disso.
- Minha mulher já tinha dito que não iria e eu consegui descobrir onde você ia passar o fim do ano.
- O que você pretende? Controlar minha vida?
- Não, pretendo ter você em meus braços. Quero você e vou lutar por você.
- Você é obsessivo. Me deixa em paz, por favor!
- Não, não vou deixar você em paz.
- Ele disse isso e me beijou. Um beijo mais intenso do que da última vez. Disse que me amava, que me queria e que não ia me deixar escapar dele. Eu fiquei louca. Ele me levou prum lugar onde ficamos sozinhos e...
- E...? – Brenda quase deduziu
- Carla... – Alessandra percebeu pelo meu olhar
Eu não disse adeus só ao ano. Também aos meus dias de pureza e minhas amigas me conheciam tão bem que um olhar bastava pra dizer tudo.
- Carla, você é louca! – Brenda não conseguiu esconder seu espanto e a decepção que sentiu ao ver minha fraqueza.
- Brenda, pega leve – Alessandra tentou acalmá-la
- Mas como Alessandra? Ela fez a última coisa que deveria ter feito! Isso não vai acabar bem, ela vai sofrer as consequências.
- Gente! – eu levantei chorando, gritando – Eu gosto dele, sou louca por ele! Não suporto mais esconder o que sinto! Aconteceu, sim, não sei se vai acontecer outra vez, mas pelo menos fica a lembrança de que foi com alguém que eu amei! Não programei, sempre disse que queria que fosse com a pessoa certa na hora certa mas é difícil ser coerente! Eu quis, já fiz, agora não tenho como voltar atrás!
Continuei a chorar muito encostada na parede e Alessandra chegou perto de mim e acariciou meus cabelos procurando me acalmar e perguntou:
- Pelo menos vocês se preveniram?
- Eu...há algum tempo já tomo pílula e ele tava prevenido.
- Bom, pelo menos não corre o risco de pegar uma doença ou ficar grávida. – Brenda se tranqüilizou, mas sua voz continuava num tom de decepção.
- Você sempre a certinha! – falei agressiva
- Você deveria se preservar. – Brenda falou com um tom de superioridade. – Quando viu que era ele podia ter gritado, pedido ajuda. Você quis que acontecesse!
- E daí? Eu gosto dele!
- Vamos parar de discutir, gente! – Alessandra interveio – Carla ainda tá vivendo a emoção da coisa, foi difícil pra ela e você tá recriminando. As duas vão acabar se ferindo, vamos parar por aqui!
- Alessandra, eu não vou ser falsa. Já pensou o que vai ser dela daqui pra frente?
- Tá, Brenda. Eu também fico preocupada. Mas agora já aconteceu. Não adianta falar que ela devia ter evitado.
- Alessandra. Desculpa. - eu disse ainda chorando - Eu nem pensei em você. O Beto foi mais uma decepção pra você e eu nem fiquei do seu lado.
- Nós duas ficamos muito mais preocupadas com você. – Alessandra disse trazendo Brenda pelo braço pra perto de mim.
- Eu sei... Eu nunca pensei que ia me deixar envolver assim por alguém. Mas juntou tudo. Eu não gosto de garotões, ele é um homem bem mais velho, mais maduro. O casamento dele não deve estar bem mesmo e acho que tô alimentando uma esperança que ele venha a se separar, apesar de já ter dito a ele antes que não queria destruir um casamento.
- Sua cabeça deve estar uma confusão só. – Alessandra observou
Brenda veio até a mim e disse:
- Eu não quero recriminar você. Mas pensa bem, Carla, que futuro cê vai ter com aquele cara? Num dia de ano novo você, escondida com ele. Se isso vai adiante, você vai estar sempre se escondendo, na agonia da espera que ele deixe a mulher e fique com você. Isso é muito sofrimento. Você vai se prejudicar no trabalho, na faculdade. Vai ter que se contentar sempre com as migalhas que ele oferecer.
Eu chorei mais e me joguei nos braços de Brenda. Ela fez carinho nos meus cabelos enquanto eu falava:
- Eu sei. Foi mais forte do que eu. Ele foi tão insistente, tão determinado que eu cedi. Não tiro ele da cabeça, ainda mais agora. Não sei como vai ser, mas eu amo o Marcos. Não queria que fosse assim, mas é. Pôxa...estraguei o ano novo de vocês... – falei chorando ainda mais apertando Brenda nos meus braços e ela correspondeu continuando a fazer carinho nos meus cabelos. Alessandra se abraçou conosco e disse:
- O réveillon já tava estragado, Carla. Foi melhor ficar preocupada contigo do que pensar no que o Beto e aquela turma esquisita dele tavam fazendo. Esqueci logo quando lembrei de você, amiga. Eu queria fazer tudo agora pra você não sofrer.
- Eu também – Brenda disse.
- Gente... – falei com a voz embargada. – Vamos ser sempre amigas e não deixar que nossos problemas atrapalhem nossa amizade. Eu não posso ficar sem vocês. Mesmo que eu ainda cometa outras loucuras, por favor não virem as costas pra mim. Mesmo que eu não goste de ouvir, falem o que vocês pensam, mesmo que eu não concorde, mesmo que eu quebre a cara. Quem sabe mais tarde o que a Brenda falou não vai servir?
- Eu espero que sirva agora, não quero ver você sofrer. – Brenda acrescentou
Eu fiquei sensibilizada e dei um beijo no rosto dela.
- Eu te amo Brenda. – eu disse
- Também te amo, Carla. Tenha certeza de que onde estiver, meu coração vai com você.
- E o meu também – Alessandra disse
- Lessandra...- também dei um beijo no rosto de Alessandra que me abraçou mais forte junto com Brenda.