SOZINHA NA PRAIA – ALESSANDRA
Pode isso? Tá acontecendo comigo? Eu pensava deitada na minha canga banhada por aquele sol abrasador. Triplamente arrasada, sem meu pai, sentindo a falta dele apesar de não ter quase lhe dirigido a palavra quando ele saiu. Séria, calada, ia à praia como num gesto mecânico ia e voltava da água, deitava, recebia os raios de sol de olhos fechados e meu desejo era que os abrisse e visse Brenda e Carla ao meu lado. Que angústia! Carla foi embora antes de Brenda, que depois daquela fatídica manhã ainda ficou um mês. No mesmo dia que chegou, ligou de um orelhão. Tinha telefone em casa, mas a mudança estava tão confusa que achou melhor ligar da rua. Brenda ainda estava sem telefone. A casa da Penha estava fechada há mais de três mêses aguardando um locatário e diante da demissão do pai dela, a única saída era mesmo ocupar o imóvel. Mesmo morando bem, curtindo a praia eu sofria perdas. Aquela praia naquela manhã representava minha solidão. Nada tinha graça pra mim. Sentia-me sozinha na praia, por que fui sozinha. Ninguém que eu encontrasse, fosse o maior gato, alguma outra amiga de colégio ou da academia preencheria o vazio deixado pelas minhas almas gêmeas, minhas queridas Brenda e Carla. Ao meio dia levantei e enrolei-me na canga vermelha e um moreno alto, até bonito, me pareceu um monstrengo pela sua cantada vulgar:
- Me empresta esta canga, lourinha, sou um toureiro.
- Palhaço! Sai da minha frente!
Cheguei em casa e minha mãe falou:
- Brenda ligou. Pediu desculpas por ter demorado tanto a ligar outra vez, mas ela tava morta arrumando o quarto, limpando, comendo poeira. Disse que assim que puder vem aqui. Senti muita tristeza na voz dela. Disse que Carla ligou pra ela também logo que chegou a Paciência.
- Pôxa... E eu naquele sol, só pensando nela e na Carla...
- Vocês vão logo matar as saudades. Eu sei o que você tá sentindo, também tive amigas que foram morar longe.
- Mãe, elas não são só amigas, elas são parte de mim, mais que irmãs.
- Eu sei filha.
- As coisas vão mudar um pouco pra gente, né? – perguntei tentando me preparar para algo pior, embora não pudesse haver nada pior pra mim além da separação dos meus pais e a distância das minhas amadas amigas.
- Bem, nós não temos mais o aluguel dos pais da Brenda, mas deve aparecer alguém pra alugar, já tá anunciado.
- Meu pai não vai querer vender este apartamento ou alugar?
- Não filha, ele pensou em você. Vai deixar o imóvel no seu nome em usufruto meu. Até foi generoso. Disse que assim que resolver todas as questões legais vai ficar mais um pouco na casa dos seus avós e procurar um apartamento pra ele.
- Por que isso tinha que acontecer...
- Isso acontece com várias pessoas a todo o momento.
- Eu sei, mas logo com a gente?
- Alessandra, você acha que a Brenda e Carla não estão se perguntando também por que tinham que mudar de vida de repente?
- Meu problema foi pior.
- Elas não sofreram uma separação na família, mas não esperavam um dia chegar em casa e saber que não iam morar mais em Ipanema. Num aspecto você está melhor do que elas: vai continuar morando no mesmo lugar. Seu pai continua muito bem financeiramente, você vai cursar a faculdade, em breve vai ter seu carro. Suas amigas, meu bem, não tem papai que banque tudo. Até eu vou voltar a trabalhar como free-lance. Vou espalhar fotos pras revistas, pras agências, pra não depender só do seu pai. A vida continua e ninguém morreu.
- Eu me sinto de luto.
- Ai, Alessandra, como você é dramática, minha filha! Olha, toma um banho, lava suas madeixas, a gente pode sair depois.
- Prefiro ficar em casa. Quem sabe a Brenda ou a Carla não me ligam.
- Elas só não convidaram você ainda, porque devem estar muito ocupadas. Quando estiver com a Brenda também procure dar força à ela. Ela é muito solidária na dor, compreendeu sua tristeza pela separação de seus pais melhor do que você entendeu a situação em que ela está. Ela vai começar a faculdade, conseguiu gratuita, mas tudo tem seus encargos financeiros. O pai dela foi demitido depois de anos de serviço. Já parou pra pensar no que é isso na idade dele com a crise do país? Você está sofrendo, não desmereço sua dor. Eu também tô, acha que é fácil terminar um casamento de quase 20 anos? Só que eu sei quem sou: sou Lúcia, posso superar as dores e ir em frente e sei que o mundo não é feito só de Lúcia, como não é feito só de Alessandra. Suas amigas assim que souberam o que houve com você procuraram te dar o maior apoio e os problemas delas passaram a nem existir mais. Nunca se esqueça disso. Elas te amam.
Tomei banho, fui pro quarto e durante um bom tempo pensei no que minha mãe disse e senti vergonha de achar que era a garota mais infeliz do mundo.
Diálogo, ou quase isso.
Há 13 anos
Na vida que temos que ter cuidado para não achar que os nossos problemas são maiores do que os dos outros.
ResponderExcluirA paz!
Amém, irmã! Obrigado pela sua frequência no meu blog. Espero em breve postar no seu blog, falando do esperado 23º capítulo. A paz do Senhor.
ResponderExcluirVinicius, esta historia esta fantastica!!
ResponderExcluirContinue... nao pare... esta empolgante...
e devo concordar com um comentario de outro cap. essa historia nao se difere muito da realidade... parece que tenho muitas coisas a aprender!!
Deus abençoe...
Obrigado irmãzinha. As impressões de vocês são o melhor retorno. Eu me baseio muito no cotidiano e aprendo muito com os comentários de vocês. A paz do SENHOR. Continue postando a cada leitura.
ResponderExcluir" elas não são só amigas, elas são parte de mim...". vc falou tudo nessa frase, é assim mesmo!!
ResponderExcluirTô com medo de le o restante, ainda to chorando... ta ficando muito lindo...
Amanhã eu termino de ler os outros cap, ta?
Fica na paz... parabéns pelo talento!! ^^
Obrigado, irmã, mas também parabenizo você pela sensibilidade. Poucas são as pessoas que se emocionam tanto. Eu me emociono até com episódios de seriados, que mesmo simples e despretensiosos, falem de relações humanas. Sei que ainda exite amizade verdadeira e pessoas que valorizam este sentimento e é claro que cada leitor daqui é assim. A paz do SENHOR.
ResponderExcluirAdorei o diálogo de mãe e filha. Lúcia mostrando ser uma pessoa centrada que sabe como lidar com seus conflitos e Alessandra uma menina boa, pois tem a capacidade de colocar em reflexão as palavras de sua mãe, gostei desse exemplo que Lúcia dá como mulher e mãe.
ResponderExcluir13 de janeiro de 2010 00:30
Obrigado. Interessante ver um parecer assim. Os leitores analisam de diferentes formas e sua observação foi muito importante.
ResponderExcluirToda Lucia e decidida e sabe dar a volta por cima rsrsrs
ResponderExcluirGostei da conversa entre mãe e filha.
ResponderExcluirSempre tenho esse tipo de conversa com minha mãe e isso faz a gente refletir muito.
mal posso esperar para ler a continuidade da história.
Gostei muitíssimo deste capítulo. Principalmente da atitude de Lúcia. Nos faz refletir. Parabéns!Particularmente gosto mto de leitura onde me identifico. Grande abraço.
ResponderExcluirMuito bem mãe!! a alessandra hoje parecia uma criança birrenta... é o processo de separação e perca que faz isso.
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